14-05-21-foto-capa

Sem fiscalização, criminosos utilizam ramais para levar carros roubados à Bolívia

Boliviano responsável por receptação de veículos é preso

O boliviano Roger Lopes Salazar, conhecido como “o Gordo”, foi preso na semana passada pela Polícia Militar, em Plácido de Castro. Ele é considerado um dos homens mais perigosos e influentes dentro da organização criminosa que compra carros roubados do Acre.

O Gordo já vinha sendo monitorado pela polícia. Casado com uma brasileira, ele tem moradia em Plácido de Castro e na vila Evo Morales, na Bolívia.

Quando um carro era roubado no Acre, Gordo é quem fazia o pagamento aos bandidos brasileiros e depois era ele quem organizava a passagem do veículo pela vila Evo Morales, até chegar à estrada que liga a cidade de Santa Rosa, distante 60 km da fronteira. De Santa Rosa ele levava o carro ou motocicleta a Ribeiralta, onde era vendido.

“Esse alvo é uma figura central e importantíssima aqui na receptação dos veículos roubados. Ele é o elo entre os puxadores de carros – as pessoas que atravessam os carros pelos ramais – até a Bolívia”, explica o delegado Danilo Almeida.

O esquema de Gordo foi descoberto quando a polícia intensificou a investigação em 30 de dezembro do ano passado. A organização comandada pelo boliviano roubou duas camionetes da prefeitura de Plácido de Castro. Os veículos foram encontrados pela polícia boliviana atolados na estrada que liga a Santa Rosa.

No interior de uma das camionetes foi encontrado o recibo de uma padaria. A polícia então foi atrás das câmeras de segurança do local e descobriu um dos suspeitos comprando sorvete e lanche. O homem recebe uma sacola e pede um recibo, e através dele os policiais chegaram a Gordo e mais oito possíveis membros da organização criminosa.

“Era ele quem fazia toda negociação entre os criminosos brasileiros e bolivianos, tanto na receptação dos veículos roubados como no contrabando de armas e drogas”, afirma Dário Almeida, capitão da Polícia Militar.

Gordo mantinha uma tabela de valores para a compra dos carros roubados. Uma camionete, por exemplo, que custa mais de R$ 100 mil no Brasil ele pagava R$ 20 mil, e o dinheiro que deveria ser dividido entre os brasileiros que participaram do roubo.

14-05-21-gordo

“Por cada veículo roubado o grupo recebe uma quantidade de dinheiro, mas ela não é significativa. Na tentativa de ganhar mais dinheiro, os criminosos promoviam inúmeros roubos. Ocorriam um ou dois roubos por semana”, explica Danilo Almeida.

O boliviano preso teve que ser retirado imediatamente da Delegacia de Plácido de Castro. A polícia recebeu a informação de que a organização criminosa da qual ele fazia parte estava se preparando para retirar ele de dentro da cela. O homem também comanda o tráfico de drogas na região do Abunã.

A ação das quadrilhas de roubo de carros é facilitada graças a vários fatores. O primeiro deles é a falta de fiscalização nas áreas de fronteira. Saindo de Rio Branco com o veículo roubado, os criminosos podem passar o carro ou motocicleta para o lado boliviano em vários pontos.

No trevo próximo a cidade de Senador Guiomard, por exemplo, raramente alguém é parado. Cerca de 50 km adiante, na BR-317, tem o município de Capixaba, e não existe trânsito frequente na rodovia, o que ajudaria numa eventual fiscalização.

Já na cidade, entrando por uma estrada de chão, 5 km depois já está a fronteira, na vila Mamparro. A equipe de reportagem da TV Gazeta esteve no local e não havia nenhum policial ou câmeras no posto de fiscalização.

Entrando no ramal a pessoa consegue sair em várias regiões e cidades bolivianas. Essa é uma rota bem conhecida pela polícia, e apesar disso, a estrada continua aberta, livre e sem fiscalização.

Ainda no trevo de Senador Guiomard, os criminosos podem pegar também AC-40 no sentido de Plácido de Castro. Na rua central do município basta pegar um acesso a vila Evo Morales. E, mais uma vez, a equipe não encontrou nenhuma fiscalização. Tudo estava livre da rua de acesso, que foi asfaltada recentemente, até a ponte na fronteira.

Depois que entra na vila, a polícia boliviana, apesar de ter uma barreira, não exige documentação. É só atravessar a rua com as lojas comerciais e pegar a estrada que dá acesso a Santa Rosa do Purus.

A estrada boliviana também é facilmente acessada pela rodovia AC-40 em vários pontos. São muitos os ramais que levam até o igarapé Rapirã, que é marco divisório da fronteira.

14-05-21-lanche

Em um ramal com acesso no km 70 a polícia já descobriu que é a passagem de gado roubado e drogas para o lado brasileiro. A equipe da Polícia Militar, comandada pelo capitão Dário, descobriu várias pontes no igarapé Rapirã, alguns delas permitem até a passagem de veículos.

Um grupo de brasileiros chegou a ser preso, flagrados construindo a ponte em outro ramal que dava acesso a BR-317. O mais interessante, é que na região tem uma casa que deveria ser usada pela polícia boliviana, mas ela fica sempre vazia.

“Nós temos 103 km de malha fluvial entre o rio Abunã e o Rapirã, além disso, essa fronteira tem vários ramais que dão acesso, mas só existe oficialmente uma ponte para o tráfego de veículos, nós destruímos outra clandestina”, conta o capitão Dário.

Agora os militares descobriram novas estratégias para passagem dos veículos longe do olhar da polícia. As quadrilhas saem com os carros roubados pela BR-364, em sentido a cidade de Porto Velho. Dirigem por 100 km até a entrada de Acrelândia, rodam mais 16 km até chegar a principal rua do município.

A polícia descobriu que Acrelândia tinha se tornado uma rota das quadrilhas porque um dos veículos roubados chegou a abastecer no município e depois foi levado para Plácido de Castro. Essa rota aumenta a distância, mas tem a vantagem de não ter fiscalização policial.

Na AC-475 também não tem fiscalização, é só dirigir tranquilo até chegar a Plácido de Castro. A polícia descobriu outro ramal que possui saída na BR-364. No período de chuva é difícil o tráfego, mas, quando chegar o verão amazônico será caminho livre para as quadrilhas.

O rio também é usado para passar as motocicletas roubadas. As quadrilhas usam os barcos e levam esses veículos até áreas da Bolívia onde são descarregadas. Outro fator que estaria ocorrendo para a passagem dessas motos, é que agentes da polícia boliviana podem estar facilitando o acesso mediante pagamento de propina.

Os agentes brasileiros já verificaram que na hora da passagem dos carros roubados nunca tem policial na tranca boliviana. Tem ainda a facilidade de venda nas cidades do país vizinho, e em muitos casos, os documentos desses veículos são modificados. O carro e motocicleta vão facilmente para o nome do boliviano que comprou o veículo, muitas vezes pela metade do preço do mercado.

Enquanto isso, no Acre, os roubos de veículos não param. Além de perder o carro as vítimas ainda passam horas de terror com armas apontadas para o corpo, e elas só são liberadas quando o veículo roubado é entregue na fronteira.

Deixe seu comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *