A cobertura de temas sensíveis, como o suicídio, exige dos jornalistas uma abordagem cuidadosa e responsável. A maneira como o suicídio é tratado pode ter um impacto profundo não apenas sobre as pessoas afetadas, mas também sobre a audiência em geral. Dada a seriedade e a complexidade do tema, é essencial seguir diretrizes para garantir que a cobertura seja ética e construtiva.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) fornece diretrizes para a cobertura de suicídios na mídia, destacando a necessidade de uma abordagem sensível e informada. No Brasil, a campanha Setembro Amarelo também oferece orientações específicas para a mídia, com o objetivo de evitar a propagação de informações que possam agravar o sofrimento das vítimas.
Impacto do Sensacionalismo Através da Mídia
Conforme destacado pela professora de jornalismo da Universidade Federal do Acre (Ufac), Juliana Lofego, o erro mais comum nas matérias sobre suicídio está no sensacionalismo. Ao explorar excessivamente o acontecimento, a cobertura pode causar mais danos do que benefícios. “A cobertura responsável não deve focar em detalhes do método usado ou explorar as causas de maneira superficial, já que o suicídio é um fenômeno multicausal”, enfatiza Lofego. A professora reforça que o papel do jornalista é tratar o tema como uma questão de saúde pública, apontando caminhos de prevenção e formas de buscar ajuda, como o trabalho realizado pelo Centro de Valorização da Vida do número 188.
Segundo o psicólogo e jornalista Fábio Cadorin, seguir as diretrizes da Organização Mundial da Saúde (OMS) é fundamental para minimizar os riscos de uma abordagem inadequada. “A mídia tem um poder imenso de influência, e uma reportagem malfeita pode ser prejudicial para quem está em situação de vulnerabilidade. Por isso, o jornalista deve evitar divulgar detalhes que possam inspirar outras pessoas em sofrimento a tomar decisões drásticas”, explica Cadorin. Ele ressalta que a cobertura deve focar nas alternativas ao suicídio, como tratamentos disponíveis e redes de apoio, em vez de exaltar o ato ou associá-lo a uma solução para crises.
“È importante jamais relacionar o suicídio a uma solução ou saída para momentos de crise e muito menos considerá-lo como ato heroico ou corajoso. Se pessoas próximas a quem sofre puderem reconhecer sinais de quem está com estes pensamentos, as chances de que façam alguma intervenção de ajuda aumentam.O foco deve estar sempre nas saídas possíveis para a crise e nunca no ato em si.”, Fábio Cadorin.
Prevenção de Estigmas em Torno do Suicídio
Ambos os especialistas concordam que a mídia pode desempenhar um papel importante na prevenção ao suicídio ao abordar questões de saúde mental de forma apropriada. A ênfase deve ser sempre na prevenção e nos sinais de alerta, promovendo uma cultura de cuidado e incentivo à busca por ajuda. “Informar sobre saúde mental e reduzir o estigma em torno do tema é essencial. A mídia pode fazer isso ao trazer histórias de superação e mostrar que existem soluções”, destaca Cadorin.
“Se a redação não estiver preparada para lidar com a questão, pode haver dificuldades quando surge a necessidade de cobrir um evento que envolva suicídio. Por exemplo, se um suicídio impacta o trânsito da cidade, é importante informar o público de forma transparente.”, Juliana Lofego.
Lofego ainda aponta que o jornalista deve estar atento a recursos disponíveis, como manuais e cartilhas da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), que oferecem orientações detalhadas sobre a melhor forma de abordar o tema sem causar mais sofrimento ou influenciar negativamente a audiência. “A formação dos jornalistas é fundamental para garantir uma cobertura ética e eficiente. Eu tento sempre colocar isso independente da turma, falar como deve ser uma abordagem correta do suicídio, apresentar as cartilhas.“, afirma.
“As palavras não têm sentido neutro. A cartilha do Setembro Amarelo direcionada à imprensa sugere, por exemplo, que não se use a palavra “suicídio” em chamadas ou manchetes. Também propõe que não se façam chamadas dramáticas ou sensacionalistas que deem destaque à morte. Palavras que trazem um tom mais encorajador, esperançoso e favorável à vida são sempre bem-vindas. Repito, a ênfase precisa estar em alternativas de cuidado e prevenção.”, Fábio Cadorin.
Conscientização Através da Ética Jornalística
Ao longo dos últimos anos, a campanha Setembro Amarelo tem buscado conscientizar a população e a imprensa sobre a importância de falar do suicídio de maneira responsável. Um dos princípios mais importantes é não transformar casos de suicídio em espetáculo ou tratá-los como soluções para momentos difíceis. Para os jornalistas, o desafio está em equilibrar a necessidade de informar com a obrigação de proteger aqueles que estão em situações de risco.
“Entendo que alguns meios de comunicação preferem não abordar certos casos, possivelmente por receio de cometer erros. Em geral, em casos comuns de suicídio, pode-se argumentar que a imprensa optar por não cobrir o assunto não é um problema. No entanto, é crucial que os veículos de comunicação não tenham medo de tratar desse tema.”, Juliana Lofego.
Dessa forma, a cobertura do suicídio deve ser feita com discrição, empatia e, sobretudo ética. Ao seguir essas recomendações, a imprensa pode cumprir o papel social de maneira positiva, ajudando na prevenção e no combate ao estigma em torno da saúde mental.