Você acessa o seu e-mail, rede social ou WhatsApp e vê que recebeu uma mensagem de alguém desconhecido:
“Olá, sou Emília, posso falar com você?”.
Na foto de perfil figura uma mulher atraente, esboçando um sorriso. Você a responde, e ela se apresenta como alguém que está numa cidade ou até num país distante. Puxa papo, manda fotos, te elogia. A conversa de vocês dura já alguns dias. E, de repente, se percebem emocionalmente envolvidos.
No entanto, quando você fala em se comunicar por áudio, vídeo ou mesmo telefone, ela sempre dá uma desculpa – “sou extremamente tímida”, “a bateria está fraca”, “minha conexão está ruim”, “o celular é velho”. Será que há algo de errado? Não pode ser, ela parece tão sincera nas palavras. E já mandou tantas fotos, até de documentos pessoais! Não, nada de desconfiança: está tudo certo, ela vai marcar uma viagem e vocês vão se encontrar para viver esse amor.
Eis que Emília surge com um probleminha: uma pequena taxa para regularizar uns documentos antes de poder comprar a passagem. Tudo bem, como ela está com dificuldades financeiras, então você faz o Pix.
Noutro dia, ela te conta que teve o cartão bloqueado ao tentar comprar algumas roupas para a viagem. “Sem problemas”, você pensa, e envia o seu número de cartão.
Depois, mais um contratempo, desta vez para comprar a passagem. De novo, soa estranho. Mas ela te manda cópias das telas, dos documentos, enfim. Como tudo parece em ordem, você manda o dinheiro da passagem – afinal, quer encontrá-la logo.
Mas situações assim – em que ela pede cada vez mais dinheiro -, continuam surgindo. E embora não quisesse confrontar a realidade, finalmente torna-se evidente: você foi vítima de uma fraude.
Existente no formato digital há pelo menos uma década, o chamado “golpe do romance” faz vítimas todos os anos. Com o aumento na busca online por relacionamentos – ocasionada pela pandemia -, o FBI estima que só em 2021 cerca 133 milhões de dólares foram perdidos nesse tipo de fraude.
O golpe, muitas vezes praticado por organizações criminosas, envolve a demonstração de interesse amoroso para conquistar a confiança e o afeto da vítima. A ideia é envolvê-la, e solicitar cada vez mais dinheiro.
A intenção dos golpistas é ganhar na escala: por meio da internet, eles enviam mensagens a milhares de pessoas – e estatisticamente sempre haverá algumas que responderão.
Com essas, tenta-se iniciar uma conversa e criar o vínculo necessário à fraude. As fotos que utilizam, muitas vezes tiradas da própria internet, costumam ser de homens ou mulheres atraentes. As histórias variam – em uma das versões do golpe, a mulher se passa por uma militar em missão na Líbia, motivo pelo qual ela não teria permissão para falar por ligações de voz ou vídeo. O esquema é tão sofisticado que os criminosos fazem rodízio para conseguirem conversar com as vítimas em diferentes horários, sempre usando o mesmo script.
Para quem está de fora, pode parecer absurdo cair em algo assim. Contudo, em muitos casos o golpe é bem elaborado, e acompanha várias fotos e documentos – todos falsos – para conferir maior credibilidade à identidade do farsante.
Além disso, é natural que em meio a milhares de mensagens enviadas pela internet, os criminosos eventualmente encontrem pessoas que estão passando por uma fase de maior vulnerabilidade emocional – bem como outras que não entenderem sobre tecnologia e a facilidade com a qual imagens e fotos são manipuladas. Não à toa a British Psychological Society apontou que a maior parte das vítimas – mas não todas! – têm entre 40 e 60 anos.
Existem vários outros golpes semelhantes a esse, que não se baseiam exatamente no romance. Mas o princípio é sempre o mesmo: ganhar e abusar da nossa confiança.
Fica o alerta para o leitor.
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Gustavo Cardial é especialista em Computação Forense, mestrando em Ciência da Computação e professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Acre (Ifac)