Segundo ativista do Movimento S.O.S Autistas Acre, 30 escolas de Rio Branco sofrem com a falta de mediadores
Em Rio Branco as aulas da rede municipal iniciaram no dia 21 de março e as do estadual no dia 11 de abril. Foram mais de dois anos de ensino remoto, e agora os estudantes estão se adaptando a essa retomada, mas nem todos que deveriam estar frequentando as aulas estão. É o caso das crianças atípicas.
Uma das mães que sofre com a filha fora da escola, é a dona de casa Gleuciane Queiróz, de 30 anos, moradora do bairro Plácido de Castro. Ela relata que a filha de 5 anos tem microcefalia e apesar de estar matriculada na escola municipal Afonso Pinto de Medeiros, ela não iniciou o ano letivo junto com os colegas, pois a escola está sem mediador.
“O problema é que não tem ninguém quem cuide dela, a professora não pode ficar com ela, pois a profissional fica muito sobrecarregada, já que além de cuidar de uma turma cheia de alunos, ela não conseguiria levar minha filha de 15 em 15 minutos no banheiro, pois devido algumas cirurgias que ela fez minha filha não pode ficar sem ir ao banheiro”, conta a mãe.
Além desse problema, a filha também passa por outro impasse. “Desde quando começaram as aulas, ela não foi para a escola, e com isso bate o desespero na gente, porque ela está sem fazer a fisioterapia no Dom Bosco e está sem estudar, pois, no Dom Bosco falaram que ela só ia fazer a fisioterapia se ela estivesse na escola”, concluiu a mãe.
Quem também passa por essa situação, é a Átila Christina, de 33 anos, com o filho de 12 anos, que sofre com o Transtorno do Espectro Autista (TEA). Ele deveria estar cursando o 6° do Ensino Fundamental na escola estadual Leôncio de Carvalho, pois também está matriculado, mas foi informado para ela que não seria possível o aluno iniciar o ano letivo, devido à falta de mediador.
“Ele está desde o dia 25 de abril sem ir a escola, e quando eu fui fazer a matrícula dele me disseram que iria demorar um pouco para chegar mediador. Além disso, me falaram que eu não tinha pedido mediador para ele. E agora, logo no começo das aulas quando eu fui levar ele não tinha mediador. Depois disso fiz o pedido do mediador e pediram novamente para esperar, e até agora nada”, conta Christina.

Diferente das outras mães, Thauane Batista, de 30 anos, tem um filho de 4 anos e outro de 7 anos que também tem TEA, e estão matriculadas e estudando normalmente. O mais velho estuda no Instituto São José, e tem o mediador, já o mais novo, que estuda na escola municipal Menino Jesus, ainda sofre com a falta de um profissional.

A mãe relata que o filho sofre muitas crises em sala de aula pela falta do mediador e por ela ainda não ter conseguido um atendimento médico para ele na rede pública do município. Além disso, a mãe afirma que já passou por diversas situações com os professores que a deixaram a desconfortável.
“Uma mulher que foi fazer avaliação na escola disse que ele tinha um olhar perdido e aí eu já fiquei preocupada porque não estava compreendendo direito. Nisso a diretora me relatou que na escola existiam também várias crianças autistas e que o meu filho não estava deixando os coleguinhas da sala estudar, porque naquele dia que eu fui lá, ele passou o dia todinho gritando, batendo e querendo abrir a porta, e assim assustando algumas crianças. Eu me senti mal com isso”, relembra a mãe.
A mãe explica também que foi recomendado que ela buscasse um tratamento para o filho, para que pudesse socializar mais com os amigos dentro de sala, pois a situação não estava fácil. “Algumas crianças não estavam querendo mais ir pra escola por causa dele, e com isso, fiquei chateada e ao mesmo tempo triste”, conta.
Ela reitera que não consegue realizar esse tratamento, pois está a mais de quatros anos buscando atendimento para os dois filhos, e não consegue. Além disso, a mãe também informou que todas as tentativas de conseguir um benefício foram negadas.
“Eu luto há mais de quatro anos pra conseguir atendimento dos meus filhos na rede pública, e ainda estou na luta de conseguir um benefício, pois não recebo um real. E com isso, fica difícil para eu fazer com que eles tenham esse atendimento. E na escola ficou meio constrangedor, a porta da sala do meu filho é trancada, e elas não ficam muito tempo lá fora com ele porque ele pode fugir”, concluiu.
Movimento S.O.S Autistas Acre
Essas histórias estão se tornando cada dia mais comum em Rio Branco, muitos pais com filhos atípicos sofrem com a falta de mediadores nas escolas. Para entender melhor o porquê de isso ocorrer, a Adjayna Santos, mãe de dois autistas e ativista das causas Autistas, idealizadora do grupo Movimento S.O.S Autistas Acre, afirma que:
“O descaso das secretarias de educação estadual e municipal. Eles estão muitos acomodados e não se importam a resolver um problema tão grave, se eles têm consciência de que existe sempre esse atraso por falta de tempo para resolver com urgência. Questionamos eles, se tivesse todo o procedimento de qualificar, e chamar profissionais, porque não fazem com antecedência ao início do ano letivo presencial, como por exemplo, no final do ano letivo, no período das matrículas, onde os pais já levam laudos neurológicos”, explica.
Além disso, segundo a ativista, existem aproximadamente 30 escolas que estão sem mediadores ou cuidadores. Ou até mesmo, crianças de diferentes deficiências agrupadas sob os cuidados de apenas um mediador, sendo que por lei cada criança tem direito ao seu cuidador.
“A presença do profissional mediador ou cuidador é a peça fundamental na inclusão, no apoio, no processo de aprendizagem e intermediário na socialização com outras crianças e jovens. Sem eles a criança ou jovem fica numa situação de abandono, podendo sofrer violências psicológicas ou físicas, ou vir agredir um colega da escola por falta de apoio em um momento de crise, e neste ponto vale ressaltar a necessidade da qualificação adequada e profunda desses profissionais para trabalhar com eles no dia a dia”, ressalta Santos.
Manifestação
De acordo com informações da idealizadora do grupo Movimento S.O.S Autistas Acre, esse problema já existe há anos, e muitos pais estão cansados com a atual situação, e mediante a isso, eles decidiram não aceitar mais, e agora buscam formas de mudar e solucionar esse problema.O primeiro ato em prol da mudança foi uma manifestação em frente à Secretaria Municipal de Educação (Seme), que apesar das promessas, nada foi feito ainda.
“A secretária estadual no dia da nossa primeira manifestação referente à mediação escolar nos prometeram chamar 100 mediadores na mesma semana. Sim chamaram, mas não apenas para Rio Branco, mas para todos os municípios do Acre, e apenas 35 eram para Rio Branco. E isso não foi falado na reunião que tivemos no dia da manifestação, sendo assim fomos enganados”, relata a ativista.
Ela também acrescenta que foram prometidos 38 mediadores e 38 cuidadores para “casos urgentes”, e ainda segundo ela, o confrontaram dizendo que a demanda de crianças a espera desses profissionais não eram reais. Após isso, o movimento recebeu a informação de que não chamaram ninguém, e estavam buscando profissionais para “fazer dobras” nessas 38 vagas.

Com isso, após não terem as reivindicações atendidas, decidiram seguir por outro caminho. “Diante dessa situação negativa partimos então para o Ministério Público do Acre, onde estamos sendo ouvidos, mas ainda não sabemos se vai haver uma solução satisfatória da situação”, concluiu Adjayna Santos.
Secretaria Municipal de Educação
O site agazeta.net procurou informações com o Diretor de Gestão da Secretaria Municipal de Educação (Seme), João Lima, para que ele pudesse esclarecer sobre essa falta de mediadores nas escolas do ensino municipal.
“A Seme nesse primeiro momento esta realizando a avaliação pedagógica dos nossos alunos. Visto que a demanda é grande pois estamos há dois anos sem aula presencial por conta da pandemia. Estamos aguardando a conclusão do trabalho em conjunto com o departamento de educação especial para darmos continuidade ao trâmite da demanda apresentada. Para atender as necessidades imediatas foi autorizado 38 hora extras pra cuidadores e 38 aulas suplementares para mediadores”, explicou.
Secretaria de Estado de Educação, Cultura e Esportes
O site também entrou em contato com a Secretaria de Estado de Educação, Cultura e Esportes (SEE), que informou sobre esse problema.
“A Secretaria de Estado de Educação, Cultura e Esportes (SEE) informa que desde o início de maio o governo tem convocado os profissionais que atuam da educação especial para recompor o quadro e atender o aumento significativo da demanda neste ano letivo de 2022. Para essa semana está prevista uma nova convocação, em que se espera suprir todas as necessidades”, concluiu a assessoria.
Edição: Pâmela Freitas