Na última quinta-feira (9), a Polícia Judiciária do Acre efetivou o cumprimento de ordens judiciais cautelares relacionadas à uma investigação que apura a provável prática de infrações penais por um grupo criminoso responsável pelo fornecimento de refeições para as escolas públicas estaduais, operação policial denominada “Mitocôndria”.
Os detalhes da investigação divulgados pela imprensa, os nomes, relações familiares dos envolvidos e, principalmente, as consequências das supostas condutas que afetam diretamente a qualidade da alimentação consumida por crianças e adolescentes em fase de desenvolvimento físico e mental, causaram, por si só, um sentimento de indignação na sociedade acreana.
Em uma análise mais ampla da investigação policial e, deixando de lado às questões jurídicas, podemos extrair algumas considerações relevantes para compreender o contexto político da operação “Mitocôndria”, circunstância desprezada por boa parte da população e que interfere em todo o processo de punição estatal.
Inicialmente é preciso ponderar que “esquemas” de desvios de verbas públicas, fraudes nos processos licitatórios e tantas outras condutas criminosas envolvendo empresários, servidores públicos, políticos, são atos genuínos de corrupção, por isso, comumente ocorre a “politização” da investigação, fato observado em casos semelhantes no Acre e no Brasil.
O primeiro ponto obscuro envolvendo a apuração dos fatos é a publicação pela agência de noticias do governo do estado, ainda no início do mês de março, de uma matéria descrevendo conteúdo, dados e informações detalhadas da investigação.
Possivelmente o intuito da divulgação era demonstrar que o poder executivo estadual estava atento às irregularidades inerentes à merenda escolar, entretanto, o teor do texto acabou fundamentando uma série de matérias publicadas por sites de notícias locais. Uma delas estranhamente anunciava cinco dias antes da deflagração da operação policial (por eles denominada de “prato extra”), a iminente prisão de alguns envolvidos, contrariando grosseiramente um dos pilares da investigação que é o sigilo.
Outra questão contraditória é a durabilidade do “esquema” investigado. Segundo foi repassado pela polícia judiciária o grupo envolvido está há muito tempo reiterando as condutas ilícitas, contudo o procedimento policial somente foi instaurado no mês de fevereiro de 2020, apesar da Delegacia de Combate à Corrupção da Polícia Civil (DECOR) ter sido criada no mês de Abril de 2019, por meio do decreto estadual n° 1.957, sendo que anteriormente não havia desencadeado qualquer operação.
Vertente também relevante é a possível existência de crimes graves da mesma natureza praticados em outras áreas estatais, como na saúde, contudo, sem nenhuma priorização investigativa.
As considerações propostas demonstram que a operação “Mitocôndria” pode ser apenas mais uma das investigações utilizadas de forma oportunista pela política, até por que estamos vivendo um momento social extraordinário com a pandemia da Covid-19.
Entendemos, como profissional atuante da área de investigação criminal, que a subordinação direta da polícia judiciária ao executivo e interesses pessoais de gestores, acaba proporcionado o uso do aparato policial para objetivos ocultos, culminando com a priorização de investigações para atender anseios político-partidários, fatores que afetam o processo judicial e a punição dos atos de corrupção. A máxima popular deve sempre prevalecer “PUNIÇÃO PARA TODOS” e não somente para os “escolhidos” da vez.