A história de Dara acompanha mudanças e inconstâncias da política: houve bons e maus momentos
Em 2002… 2003, o Acre tinha um ritmo diferente. As decisões de ordem política tinham consequências práticas com velocidade maior. Dara Coelho que o diga. Ela corria, orgulhosa, Rio Jordão abaixo, Rio Jordão acima, enrolada em uma bandeira do Acre. Tinha cinco anos, o olhar inquieto e os cabelos desalinhados, como todos quando têm cinco anos.
À época, Dara participou de uma campanha feita pelo Governo que utilizava os símbolos do Estado para fortalecer o que, oficialmente, chamavam de “acreanidade”. Os que faziam oposição naquela época acusavam o Governo de utilizar os elementos simbólicos de Estado para fazer propaganda ideológica: era o Acre da FPA x MDA; era o Acre do “eu prefiro ser advogado do crime organizado do que (sic) do crime desorganizado”; era o Acre do “sem ódio e sem medo”; do “Nabor nunca mais!” e de Naluh Gouveia gritando sobre o “Tribunal de Faz de Contas”.
Dara Coelho passava ao largo de toda essa confusão. Ela queria continuar correndo na beira do rio, enrolada na bandeira do Acre. Para aquela menina, Jordão era um mundo grande e o rio era medonho.
Vinte anos, três governadores e quatro presidentes da República depois, Dara Coelho é uma das mais novas pedagogas formadas pela nossa Universidade Federal do Acre. A cerimônia de formatura ocorreu semana passada. O itinerário de vida de Dara, em certa medida, acompanha as mudanças e inconstâncias dos varadouros da política. Houve bons e maus momentos.
Ela conheceu a maternidade aos 14 anos: depois da Sara, vieram a Ariane, o Gabriel e o caçula, João Lucas. O primeiro marido era como tantos outros. “Ele me batia e não gostava de me ver estudar”, lembra. “Como eu fui mãe muito nova, eu tive que parar os estudos por um tempo. Quando voltei, fui para o EJA e as aulas eram à noite. Ele não gostava. Tinha ciúmes”. Ela se separou e casou de novo. O novo parceiro tem outra percepção da Educação.
Dara conta que a mãe dela era lavadeira e era uma das entusiastas de que a menina teimasse nos estudos. “Ela teve oito filhos e não queria que nós seguíssemos o mesmo caminho de sofrimento que ela”, comparou.
No Acre da pequena Dara, apenas 6% dos professores da rede pública de ensino tinham curso superior; 25,8% tinham Ensino Fundamental e 93,5% tinham o Ensino Médio. Os dados são do Inep e demonstram como o cenário era desafiador para quem executava política pública em Educação. Quem ensinaria Dara na cidade do Jordão, possivelmente, sabia um pouco mais que ela. Por mais honesto que fosse o compartilhamento do conhecimento acadêmico, havia pouco a ser dividido.
Eram muitos os desafios, com destaque para a senda que havia entre a escola e a comunidade; a Secretaria de Estado de Educação explodia de servidores e de ineficiência; a gestão das escolas era caótica, sem padrão e sem “diálogo” com a SEE.
O Governo mudou radicalmente alguns desses gargalos: em parceria com a Ufac, o Governo do Acre formou os professores da rede estadual de ensino por meio de um programa chamado Proformação, destinado para os professores leigos, que sequer tinham o magistério de nível médio.
Depois da Ufac, o Governo do Estado também fez parceria com a UnB para ações de formação de professores com nível superior. Foram formados 10 mil professores. Com a ex-presidente Dilma, o Parfor consolidou a formação de professores no interior do Acre.
Essas parcerias foram tão fortes com o governo estadual que os estudantes regulares de Pedagogia da Ufac reivindicaram que a grade curricular (até então diferenciada) passasse a ser a mesma. No Jordão, antes de Dara, dezenas de professores tiveram oportunidade de erguer o canudo com diploma de nível superior, vestidos de beca e capelo.
É claro que essa mudança na formação dos professores da rede pública estadual trouxe consequências graves para o orçamento da SEE. Em 1995, a folha de pagamento da SEE era pouco mais de R$ 51,7 milhões. Em 2003, na mesma época em que Dara se enrolava na bandeira do Acre às margens do Rio Jordão, a folha já havia disparado para R$ 161,7 milhões. Para que o Estado pudesse melhorar as condições estruturais da Educação, o Governo teve que se agigantar.
Hoje, os desafios para a professora Dara Coelho também não são poucos. Ela tem muito a fazer. Até porque, muito do que se fez nos últimos 20 anos foi desconstruído na SEE. Aliás, a Secretaria de Estado de Educação tem sido frequentada por operações policiais; envolvimentos em supostos esquemas de corrupção; o Ensino Médio continua empacado e a escola perdeu o charme para uma juventude cada vez menos encantada com a educação. A professora Dara Coelho precisa encontrar bandeiras novas. Há muitos motivos para isso.