MP acreano se destaca em grandes atuações
Na década de 50, a economia acreana não ia bem, pela segunda e última vez, a borracha estava em decadência. Muitos seringais foram a falência. Outro agravante: na condição de território, tudo era mais difícil. O Acre não tinha sequer autonomia para escolher seus governantes, a decisão partia do próprio presidente da república. Na área judicial, até um simples habeas corpus poderia levar meses para ser concedido.
“Os acreanos viveram verdadeiros absurdos. Uma pessoa que era presa tinha que pedir habeas corpus à Manaus esperar ir e vir[de navio] para poder ser solto”, relata o historiador Marcos Vinicius. Sessenta anos após a luta do movimento autonomista, no dia 15 de junho de 1962, a assinatura do então presidente João Goulart criava a mais nova unidade da federação.
Sem o fantasma do território e a tutela do governo federal, o Acre dava os primeiros passos como estado. A escolha do governador foi um marco para esta nova página da história. Na disputa entre dois José, o Guiomard e o Augusto, melhor para o cruzeirense José Augusto de Araújo. A frente do executivo, coube a ele montar a equipe que iria comandar e organizar o 22ª estado brasileiro.
Um dos nomes escolhidos foi de um velho amigo infância, Lourival Marques de Oliveira. O principal desafio dele era elaborar a constituição estadual e organizar o corpo administrativo. Recém casado, ele veio embora com a esposa para Rio Branco. Dona Edir Marques lembra que naquele tempo a capital acreana não possuía sequer padaria e água encanada. Energia elétrica tinha hora para começar e acabar.
Em 1963, mais especificamente no dia 26 de julho, a assinatura da lei estadual número 4 pelo governador José Augusto criava o Ministério Público acreano. E Lourival Marques assumiu a responsabilidade de ser o primeiro procurador geral de justiça. Um começo com muitos desafios pela frente. Foi em uma sala modesta e cedida do prédio do Tribunal de Justiça onde funcionou o MP/AC.
Naquele tempo faltavam até promotores. A primeira providência de Marques foi criar a faculdade de direito. Ele, inclusive, era um dos professores do curso. “O Lourival percebeu que era a faculdade de Direito a primeira necessidade. Até que em 1964, um ano depois, foi instalada a faculdade de Direito do Acre”, lembra Edir Marques.
Lourival Marques ficou pouco mais de um ano à frente da instituição. Durante toda a vida, seguiu carreira no meio jurídico e também na política. Em maio de 2013, aos 80 anos de idade, o cruzeirense não resistiu a luta contra o câncer e faleceu. Junto com ele, outros 17 procuradores estiveram no comando do Ministério Público estadual. Entre eles, Ciro Facundo de Almeida.
Hoje aposentado, mas não longe dos livros e da vida jurídica, Ciro tem muita história para contar. Uma dessas páginas foi marcada em 1974. Nomeado pelo então governador Wanderley Dantas, aos 37 anos, ele assumiu o cargo de procurador geral de justiça. Um dos legados de Ciro foi dar uma nova cara ao Ministério Público. “Quando assumi não tinha nada. Procurei comprar equipamentos e estruturar o MP. Muitos promotores, na época, reconheceram o esforço”, enfatiza Facundo.
A constituição de 1988, atribui novas funções ao Ministério Público brasileiro. Um deles foi a autonomia de investir contra o próprio estado. Nesses 50 anos, o MP acreano se destaca em grandes atuações. A década de 1990 ficou marcada pelo medo e também a impunidade. Diariamente, corpos apareciam jogados em vários locais da cidade. Um Acre onde crime organizado dava as cartas de quem iria viver ou morrer. Só em 1999, a criação do Grupo de Combate ao Crime Organizado chegou até o “esquadrão da morte”. Em alguns casos, quem tinha cometido o crime era o mesmo que coordenava as investigações.
Aos 27 anos de idade, o jovem promotor Sammy Barbosa foi escolhido para coordenar o grupo e virar essa página de impunidade. O caso de maior repercussão foi o julgamento de Hidelbrando Pascoal, então coronel da PM. Apontado como chefe do extermínio no Acre, ele também foi condenado a mais de 100 anos de prisão por narcotráfico e corrupção eleitoral. O ‘crime da motosserra’ ganhou repercussão internacional.
“É difícil traduzir em palavras aquela sensação que se vivia de medo real, incerteza no funcionamento das instituições. Acho que nós tínhamos chegado próximo ao fundo do poço”, argumentou Barbosa. Em 2005, o estado passou pela maior crise ambiental da história. O nível do rio Acre atingiu 1m64cm, a capital passou por um colapso no abastecimento de água. Com a forte estiagem, as queimadas fugiram do controle. Plantações e florestas inteiras se transformaram em cinzas.
Na cidade, a fumaça dificultou a vida de crianças e idosos. Com máscaras, centenas de estudantes protestaram. O principal manifesto ocorreu no prédio da Assembleia Legislativa. O clamor das ruas levou o Ministério Público do Acre a uma decisão inédita no país. Por meio de uma ação civil pública para acabar de forma gradativa com as queimadas. Quem esteve à frente, foi a então promotora de meio ambiente, Patrícia Rêgo.
Oito anos depois, ela comemora a mobilização da sociedade na cobrança de políticas públicas voltadas para a questão ambiental. “O Ministério Público, naquele momento de crise, ele foi, de fato, o grande protagonista de ser o articulador institucional”, expõe. Patrícia Rêgo é a segunda mulher a ocupar o cargo máximo do Ministério Público, em meio século.
Durante a gestão, ela destaca a derrubada da Pec 37, que, caso aprovada, iria limitar o poder de investigação do MP. Hoje, o órgão está presente na maioria dos municípios acreanos. A estrutura é bem diferente de 50 anos atrás. O trabalho desenvolvido por aqui, faz da instituição uma das mais reconhecidas e confiáveis pela sociedade.
Questionada sobre as perspectivas para os próximos 50 anos, a procuradora geral não hesitou: “perspectiva sempre de melhora. Temos que fazer uma reflexão enquanto instituição para que possamos fazer as mudanças, se aperfeiçoar e avançar no tempo e na história contribuindo e ouvindo os anseios da sociedade”, finalizou Patrícia.
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