Você já imaginou viver em um país onde metade da população não podia votar? Pois é, isso acontecia no Brasil até o início do século XX! Mas, felizmente, mulheres corajosas não aceitaram essa realidade e mudaram a história. No dia 24 de fevereiro, celebramos uma grande conquista: a instituição do voto secreto e feminino. Essa data marca a publicação do Código Eleitoral de 1932, o qual trouxe mudanças importantes para a democracia brasileira, como o voto direto, a criação da Justiça Eleitoral e, claro, a inclusão das mulheres nas eleições. O voto feminino foi oficialmente instituído no Brasil pelo Decreto nº 21.076¹, de 24 de fevereiro de 1932, garantindo às mulheres o direito pleno de escolher seus representantes e participar ativamente da vida política do país.
Mas você sabia que essa história começou a ser escrita um pouco antes? Lá em 1927, uma mulher chamada Celina Guimarães Viana fez história ao se tornar a primeira eleitora do Brasil! Professora e pioneira na luta pelos direitos políticos femininos, Celina conquistou esse feito no Rio Grande do Norte, aproveitando-se da Lei Estadual nº 660², de 25 de outubro de 1927, que permitia o alistamento eleitoral sem distinção de sexo. Assim, ela usou essa brecha na legislação potiguar para exercer o direito de votar, anos antes da oficialização nacional. Celina abriu caminho para que outras mulheres pudessem fazer suas vozes ecoar nas urnas. Se hoje você pode votar em quem quiser, lembre-se: devemos isso à coragem de mulheres como Celina, que decidiram que o lugar da mulher é também na política!

Imagem: Arquivo do Senado. Fonte: Agência Senado³
A luta pelo voto feminino no Brasil foi longa e cheia de desafios. Teresa Cristina de Novaes Marques, no livro “Voto Feminino no Brasil”⁴, destaca que a exclusão das mulheres do processo eleitoral vinha desde os primeiros tempos da República e era sustentada por argumentos conservadores. Então, feministas como Bertha Lutz⁵, uma das principais líderes do movimento sufragista brasileiro, batalharam para mudar essa realidade e garantiram um espaço para as mulheres na política. Bióloga, advogada e ativista, Bertha foi uma figura central na conquista do direito ao voto feminino, fundando a Federação Brasileira pelo Progresso Feminino e pressionando autoridades para assegurar os direitos políticos das mulheres no país.
A discussão sobre a participação das mulheres na política teve início na Revolução Francesa, quando se começou a questionar se os direitos garantidos na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão também se aplicavam às mulheres. Embora já existissem rainhas e governantes femininas antes desse período, sua influência política estava mais ligada à nobreza do que à ideia de direitos individuais.
Foi nesse contexto que Olympe de Gouges publicou, em 1791, a Declaração dos Direitos da Mulher e da Cidadã⁶, reivindicando igualdade de direitos entre homens e mulheres. A autora defendia que ambos deveriam ter as mesmas oportunidades de trabalho, já que contribuíam com impostos da mesma forma. Naquela época, muitas ideias novas estavam sendo discutidas na Revolução Francesa, mas a maioria dos homens que participavam da política não deu importância às propostas de Olympe. Acreditando que poderia conseguir apoio, ela enviou sua Declaração dos Direitos da Mulher e da Cidadã para a rainha Maria Antonieta. Porém, esse ato foi visto como uma traição aos ideais revolucionários, e ela acabou sendo condenada à morte.
Apesar da repressão, seu legado inspirou o movimento sufragista, que surgiu no século XIX e lutava pelo direito ao voto feminino em diversos países. As sufragistas eram mulheres ativistas que organizavam protestos, petições e campanhas para conquistar direitos políticos. Esse movimento teve grande impacto na Europa e nos Estados Unidos, influenciando a luta das mulheres por igualdade ao longo da história.
Na imagem a seguir, é possível ver a figura de um homem e uma mulher, aparentemente trocando de lugar em suas funções sociais. O homem aparece com uma roupa feminina, enquanto a mulher está vestida de maneira masculina, sugerindo uma inversão dos papéis tradicionais da época.
Imagem: O Malho/Biblioteca Nacional Digital, fonte: Agência Senado³
A charge sugere que, ao conceder o direito de voto às mulheres, haveria uma espécie de “troca” nos papéis da sociedade, o que, para muitos na época, representava uma ameaça ao status quo. Naquele período, a resistência ao voto feminino era forte, e muitas pessoas acreditavam que as mulheres, se tivessem poder de voto, poderiam mudar as estruturas sociais e políticas profundamente. Essa charge, portanto, reflete esse medo e a percepção de que o papel tradicional do homem como líder e da mulher como dona de casa e cuidadora seria desafiado.
Como era o processo de votação?
No Brasil Imperial, nem todos que viviam na sociedade eram considerados cidadãos com direito a voto. Na época, havia uma divisão entre dois tipos de cidadãos: os “ativos” e os “passivos”. Essa ideia veio da política francesa do final do século XVIII e foi adotada na Constituição de 1824. Os cidadãos “ativos” eram aqueles que podiam votar e participar da política. Já os “passivos” – grupo que incluía mulheres, crianças e pessoas com deficiência intelectual – tinham alguns direitos civis, como receber heranças, mas não podiam opinar ou decidir sobre assuntos políticos. Essa divisão ajudava a justificar por que as mulheres não podiam votar, mostrando como o próprio conceito de cidadania foi criado para deixá-las de fora das decisões políticas.
Professoras: vozes de transformação pelo voto feminino
Podemos destacar o papel fundamental das professoras na luta pelo sufrágio feminino no país. No início do século XX, as mulheres começaram a ingressar no mercado de trabalho, especialmente no magistério, uma das poucas profissões consideradas adequadas para elas na época. Essas educadoras, ao assumirem posições de destaque na sociedade, passaram a questionar a exclusão feminina do processo eleitoral e a defender ativamente o direito ao voto.
A imagem a seguir é uma página de jornal antigo que discute o direito ao voto das mulheres no Brasil. O título principal, em letras grandes e destacadas, diz: “A MULHER E O VOTO”. Abaixo, há um subtítulo que questiona a concessão desse direito político em relação à cultura e à organização social do país. Também há uma chamada que questiona: “SERÁ OPORTUNA ESSA INOVAÇÃO DEMOCRÁTICA?”. O conteúdo parece trazer opiniões de senadores sobre o sufrágio feminino, mencionando a “Gazeta de Notícias” como fonte das declarações. A página inclui duas fotografias de senadores, uma no lado esquerdo e outra no centro, identificados como Senador Affonso Camargo e Senador Medeiros Leal. O layout da página apresenta colunas de texto organizadas de maneira tradicional para jornais da época, com tipografia característica do início do século XX. O texto argumenta os prós e contras da participação política das mulheres, refletindo o debate da época sobre essa inovação democrática. Essa imagem representa um período histórico importante no Brasil, quando o voto feminino ainda estava sendo discutido antes de sua oficialização em 1932.

Imagem: Gazeta de Notícias/Biblioteca Nacional Digital. Fonte: Agência Senado³
A atuação das professoras foi crucial para o avanço do movimento sufragista no Brasil. Elas não apenas reivindicavam seus direitos políticos, mas também influenciavam suas alunas e a comunidade em geral, disseminando ideias progressistas e igualitárias. Por meio de sua dedicação e liderança, essas mulheres contribuíram significativamente para a conquista do voto feminino, que foi oficialmente reconhecido no país em 1932. O direito ao voto feminino no Brasil não foi concedido de forma simples. Pelo contrário, foi uma longa jornada marcada por lutas, preconceitos e persistência.
A tabela abaixo mostra as principais etapas dessa conquista, revelando como as mulheres enfrentaram barreiras ao longo dos anos para garantir sua voz na política:
Ano | Evento/Marcos Históricos | Descrição |
1824 | Constituição do Império | Mulheres não eram consideradas cidadãs ativas, portanto, não podiam votar. |
1891 | Primeira Constituição Republicana | Confirmou a exclusão das mulheres do direito ao voto, mantendo-as fora do cenário político. |
1910 – 1920 | Início das Reivindicações | Movimentos feministas surgem, liderados por Bertha Lutz e outras ativistas, lutando pelo direito ao voto feminino. |
1932 | Código Eleitoral | Pela primeira vez, o voto feminino é permitido, mas com restrições: apenas para mulheres casadas (com autorização do marido) e para viúvas e solteiras com renda própria. |
1934 | Constituição de 1934 | Garante o direito ao voto feminino, mas de forma facultativa (não obrigatório). |
1946 | Constituição de 1946 | O voto feminino passa a ser obrigatório, equiparando-se ao dos homens. |
1985 | Primeira Prefeita de Capital Eleita | Alzira Soriano é eleita em Lajes (RN), marcando a primeira vez que uma mulher ocupa um cargo de chefia executiva em uma capital. |
2010 | Primeira Mulher Presidente | Dilma Rousseff é eleita a primeira presidente do Brasil, consolidando a participação feminina na política em nível nacional. |
Dias Atuais | Desafios e Conquistas | Apesar do direito ao voto e à candidatura, as mulheres ainda enfrentam desafios na representatividade política, com campanhas por maior igualdade de gênero nos cargos de poder. |
Fonte: Adaptado de Fausto (2008), Lutz (2000), Souza (2015) e documentos oficiais como a Constituição de 1934 e de 1946
Essa linha do tempo mostra que a conquista do voto feminino foi um processo lento e cheio de obstáculos. Cada etapa representa a coragem de mulheres que não desistiram de lutar por seus direitos. Hoje, as mulheres continuam a buscar mais espaço na política, inspirando novas gerações a participarem e transformarem a sociedade.

Imagem: Arquivo Nacional. Fonte: Agência Senado³
Outro avanço importante foi a introdução do voto secreto. Antes disso, o voto era aberto, o que facilitava a pressão sobre os eleitores e favorecia práticas de corrupção. Com o novo sistema, cada cidadão passou a poder escolher seus representantes sem medo de represálias. Ainda hoje, a luta por mais participação feminina na política continua. Apesar de conquistarem o direito ao voto, as mulheres ainda são minoria nos cargos eletivos. Portanto, ao comemorarmos essa data, também devemos lembrar da importância de continuar incentivando a presença feminina nos espaços de decisão.
A história do voto feminino no Brasil é um exemplo de como a persistência pode transformar a sociedade. E que bom que essas mulheres não desistiram, não é?
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[1] BRASIL. Decreto nº 21.076, de 24 de fevereiro de 1932. Decreta o Código Eleitoral. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1930-1949/d21076.htm. Acesso: 20 de fev. 2025.
[2] BRASIL, lei estadual nº 660 DE 25 DE OUTUBRO DE 1927. Voto de saias do Rio Grande do Norte. Disponível em: https://www.tre-rn.jus.br/institucional/centro-de-memoria/os-80-anos-do-voto-de-saias-no-brasil-tre-rn. Acesso: 20 fev. 2025.
[3] SENADO FEDERAL. Para críticos do voto feminino, mulher não tinha intelecto e deveria ficar restrita ao lar. Agência Senado. 2025. Disponível em: https://www12.senado.leg.br/noticias/especiais/arquivo-s/para-criticos-do-voto-feminino-mulher-nao-tinha-intelecto-e-deveria-ficar-restrita-ao-lar. Acesso em: 15 fev. 2025.
[4] MARQUES, Teresa Cristina de Novaes. O voto feminino no Brasil. – 2. ed. – Brasília: Câmara dos Deputados, Edições Câmara, 2019.
[5] LUTZ, Bertha. A luta pelo voto feminino no Brasil: História e avanços. Rio de Janeiro, 2000.
[6] GOUGES, Olympe de. Declaração dos Direitos da Mulher e da Cidadã. 1791. Disponível em: https://www.ohchr.org/. Acesso em: 15 fev. 2025.