No último dia 15 de junho, foi comemorado os 62 anos da emancipação do Acre como Estado brasileiro, o qual anualmente geram muitas perguntas como: “O meu pai é mais velho que o Estado?” “Como o Acre tem 62 se a revolução acreana tem mais de 120 anos?”. Na realidade a resposta é muito mais simples, ambos os movimentos são totalmente distintos, em épocas diferentes e com ideais próprios, e é isto que tratarei nesta nova coluna.
Primeiramente, muitos dos cidadãos acreanos, acabam confundido a dita “Revolução acreana”, iniciada dia 6 de agosto devido aos conflitos entre Brasil e Bolívia envolvendo a extração da borracha, como o marco que tornou o Acre já Estado da União. Na realidade, este evento simboliza a anexação dos territórios bolivianos, posteriormente tornando-se Acre, ao Brasil, através do conhecido Tratado de Petrópolis¹, assinado em 17 de novembro de 1903.
Assinatura do Tratado de Petrópolis

Sendo assim, , as terras antes pertencentes à Bolívia, tornam-se parte do Brasil como um território federal, isto é, era pertencente ao país, porém não considerado um Estado de fato, e nem tinha autonomia de um. Portanto, sem poder de decisão, todos os governadores os quais comandaram o Acre durante todo esse período até 1963, eram indicados da União, sem quaisquer eleições ou meio de decisão da população acreana.
De certo, com o passar dos anos, os demasiados movimentos que buscavam a autonomia do Acre ganhavam cada vez mais força, principalmente das camadas altas da sociedade. Com isso, dentro desses grupos surgia José Guiomard dos Santos, do Partido Social Democrático (PSD).

Nascido dia 23/03/1907, em Minas Gerais, chegou ao Acre em 1946 para ser governador delegado Território do Acre pelos anos de 1946-1950, durante seu mandato foi responsável por impulsionar avanços significativos no Território do Acre, provocando mudanças profundas nos aspectos econômicos, sociais e culturais da região. Após seu governo, na campanha eleitoral para o primeiro mandato federal, ele manifestou o desejo de transformar o Acre em Estado. Embora já houvesse movimentos autonomistas antes da chegada de Guiomard, sua campanha ampliou consideravelmente o movimento, conferindo-lhe uma dimensão política mais ampla e influente. Como demonstrado no recorte de jornal digitalizado abaixo:

Neste recorte de jornal, podemos observar como era retratado Guiomard e sua campanha para a emancipação. O Acre tornou-se Estado Federal do Brasil, através da proposta do projeto de lei de autonomia d na época, deputado federal José Guiomard dos Santos. A sanção da Lei n° 4.070⁴ ocorreu no dia 15 de junho de 1962 pelo então presidente da República, João Goulart assinatura da lei conferindo ao Acre sua autonomia.
A sanção da Lei n° 4.070, em 15 de junho de 1962

Segundo a professora Maria José Bezerra na sua tese de doutorado, denominada Invenções do Acre: De Território a Estado – Um olhar social⁶…, a elevação a Estado significaria naquela conjuntura a possibilidade de viabilizar um projeto de desenvolvimento para a região, embora formulado e gestado de fora para dentro. Porém havia aqueles que criticavam essa proposta, tal como o deputado federal Oscar Passos, líder do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), o maior opositor de Guimard.
De acordo com Maria José Bezerra, Oscar Passos, acreditava que o Acre não poderia ficar sem ajuda do governo federal, ele deixa explícito sua crítica nesta passagem: “Quem conhece o Território, ou quem o visita com o objetivo sincero de investigação, sente de pronto, a impossibilidade em que ele está de abrir mão, no momento da ajuda federal, ainda precária e mal empregada no desenvolvimento do progresso, para viver a própria custa, arrancando do povo o necessário à alimentação da máquina administrativa. Seria o mesmo que lançar à rua um filho de 10 anos e deixar que ele consiga o próprio sustento [ … ]”
Contudo, suas críticas não alcançaram o efeito desejado, e a proposta foi aprovada. Consequentemente, os cidadãos brasileiros com 18 anos, tanto homens quanto mulheres, poderiam votar, desde que fossem alfabetizados. Dessa forma, no Acre, isso chegou a apenas 30% da população. Dito isso, às disputas para se tornar o primeiro governador eleito por voto ficou centrada entre José Guiomard e o professor José Augusto de Araujo. Natural de Cruzeiro do Sul, professor de história e geografia, José Augusto lançou sua candidatura pelo Partido dos Trabalhadores Brasileiros (PTB), com um discurso de “Acre para acreanos”, utilizando o fato de ser acreano em seu favor. Sendo assim, Augusto ganhou as eleições e se tornou o primeiro governador constitucional acreano e Deputado Federal, na época podia disputar ambos os cargos, eleito diretamente pelo voto, infelizmente ficou pouco tempo no poder por causa do Ditadura civil, empresarial militar de 1964, retirando novamente a autonomia acreana por longas duas décadas.
O Estado do Acre completa 62 anos da concretização de sua autonomia e independência política, como bem vimos, foi alcançada através de uma construção histórica, sendo anualmente esta data é motivo de comemorações e festividades por todo o Estado. Por fim, no ano de 2002, foi inaugurado o Memorial dos Autonomista, no centro da cidade, o qual não somente leva o nome de José Guiomard dos Santos, mas também seus restos mortais juntamente com os de sua esposa. Criado com o intuito de preservar a memória e o patrimônios daqueles homens e mulheres os quais lutaram pela autonomia acreana.
Referências
[1] TRATADO DE PETRÔPOLIS DE 17 DE NOVEMBRO DE 1903. Disponível em: https://treaties.un.org/doc/Publication/UNTS/Volume%20888/volume-888-II-698-Other.pdf. Acesso em: 18 jun. 2024.
[2] RIBEIRO, Veriana. AC: Historiador diz que Tratado de Petrópolis é certidão de nascimento. G1 Acre, 2014. Disponível em: https://g1.globo.com/ac/acre/noticia/2014/11/certidao-de-nascimento-do-acre-diz-historiador-sobre-tratado-de-petropolis.html. Acesso em: 18 jun. 2024.
[3] JOSÉ Guiomard dos Santos. Câmara dos Deputados. Disponível em: https://www.camara.leg.br/deputados/130813. Acesso em: 19 jun. 2024.
[4] BRASIL. Lei nº 4.070, de 15 de junho de 1962. Eleva o Território do Acre à categoria de Estado e dá outras providências. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/1950-1969/L4070.htm. Acesso em: 19 jun. 2024.
[5] SAAB, Resley. Nos 60 anos de elevação do Acre à categoria de Estado, conheça a saga do Movimento Autonomista liderado por José Guiomard Santos. Agência de Notícias do Acre, 2022. Disponível em: https://agencia.ac.gov.br/nos-60-anos-de-elevacao-do-acre-a-categoria-de-estado-conheca-a-saga-do-movimento-autonomista-liderado-por-jose-guiomard-santos/. Acesso em: 20 jun. 2024.
[6] BEZERRA, Maria José. Invenções do Acre: De Território a Estado – Um olhar social. Tese (Doutorado em História Social) – Universidade de São Paulo, São Paulo, 2006.
Dandara Cesar Dantas – Bacharelanda em História pela Universidade Federal do Acre (Ufac). Integrante do Centro Acadêmico Pedro Martinello.