Artigo de opinião, por Tatiana Martins
Em um estado tão pequeno como o nosso, não se pode olvidar do poder da mídia na formação da opinião pública. No entanto, em plena era da Inteligência Artificial, ainda nos deparamos com a utilização, deste importante meio de comunicação, com imagens estereotipadas por jornalistas e cartunistas para retratar mulheres e pessoas trans de maneira objetificada e desprovida de qualquer dignidade. Essas representações deturpadas não só perpetuam preconceitos e estigmas, como também reforçam o machismo estrutural e a transfobia enraizada em nossa sociedade.
Encontramos, frequentemente, charges e caricaturas que ainda se utilizam de elementos extremamente sexistas para ridicularizar mulheres, principalmente quando estamos diante de figuras políticas femininas, desconsiderando suas competências e realizações e ressaltando apenas o corpo ou alguma “qualidade sexual”. Nossa mídia local, sem exceções, já se utilizou da figura de mulheres associando-as a imagens de bruxa, anta, entre outras figuras com saias curtas, bico dos seios ressaltados, decotes exagerados, chacotas de suposta “gravidez”, etc., enquanto os homens são retratados, em sua grande maioria, com terno e gravata.
Estas imagens deixam clara a intenção, ainda que de forma inconsciente, de diminuição gratuita da imagem pública de mulheres perpetuando a ideia de que elas necessitam se enquadrar em um padrão corporal comercial e ainda assim, de que não merecem o lugar de poder ocupado ou pretensamente almejado. Também retratam um entendimento comum, mas não normal, de que mulheres não são capazes de ocupar posições de liderança com a mesma eficácia que os homens, que apenas eles podem ostentar uma barriga, que mais parece um barril de chopp e falar de um pequeno volume sobre a barriga de mulheres, sem serem questionados, sequer, sobre sua própria virilidade.
Não é diferente do que vivenciam as pessoas trans que enfrentam desafios, em verdade, ainda maiores, em sua representação midiática, com matérias jornalísticas que diuturnamente destacam de maneira desnecessária a identidade de gênero dessas pessoas, reforçando estigmas e aumentando a marginalização, destacando sua identidade de forma preconceituosa e nada inclusiva.
Portanto, a utilização destas imagens chulas pela mídia tem consequências profundas e já não são bem-vistas pela sociedade, pois as mulheres e pessoas trans não aceitam mais este tipo de tratamento vil à margem da sociedade.
Observa-se que nestas caricaturas citadas os homens se encontram quase sempre bem-vestidos e não há nenhuma acentuação sexualizada de seus corpos e nem a exigência de um padrão corporal. Reforçar a desumanização e a objetificação, alimentando o preconceito e a discriminação na sociedade não soma em nada, pelo contrário, mulheres e pessoas trans retratadas de maneira negativa enfrentam maior dificuldade para serem levadas a sério em suas profissões, opiniões e para reivindicarem seus direitos trazendo assim um agravamento ao machismo e a transfobia. Essas representações também impactam a autoestima e o bem-estar emocional dessas pessoas, que já lidam com inúmeros desafios em suas vidas diárias.
Jornalistas e cartunistas possuem uma imensa responsabilidade ética e moral de evitar a utilização de arquétipos tão prejudiciais em suas representações. É fundamental que a mídia pare imediatamente e repense seus meios de comunicação, pois não se pode pautar na comédia para realizar ações preconceituosas, devendo ela adotar uma abordagem mais inclusiva e respeitosa, que destaque as competências e contribuições das mulheres e pessoas trans, sem reduzi-las a meros objetos de consumo visual. Além disso, é necessário que haja um compromisso contínuo com a diversidade e a igualdade, promovendo narrativas que celebrem a pluralidade e a dignidade de todas as pessoas.
A mídia necessita realizar um esforço contínuo em suas abordagens e necessita se comprometer com uma representação mais justa e equitativa das pessoas, pois racismo, machismo, transfobia não são mais engraçados, são crimes e somente quando assim forem vistos poderemos construir uma sociedade mais justa e igualitária.
Esperamos realmente que os jornalistas se modernizem em suas abordagens, pois estas imagens clichês de secretárias gostosonas, romantização de relacionamentos abusivos, padronização de corpos femininos, entre outros aqui já abordados não é nada atual e nem divertido.
Somos mulheres, somos múltiplas, somos coloridas e exigimos respeito!
Advogada Tatiana Karla Almeida Martins, possui graduação em Direito pela Universidade Paranaense (2002) e pós-graduação em Direito Civil e Processual Civil. Foi Defensora Pública no Estado do Paraná. Atualmente é sócio-proprietária do Escritório de Advocacia Martins Advogadas. Tem experiência na área de Direito, com ênfase em Direito Civil e Processual Civil, atuando principalmente nos seguintes temas: direito civil, processual civil, direito administrativo, previdenciário e trabalhista.
Fonte: Escavador.