É um erro banal querer jogar a opinião pública contra as decisões da Justiça
A assessoria do governador Gladson reage de maneira atabalhoada à operação Ptolomeu 3, deflagrada na última quinta-feira. Há acertos e erros. É preciso algum distanciamento da cena para que se possa fazer uma análise minimamente isenta.
Acerto. Após repercussão negativa em toda imprensa brasileira, Cameli gravou um breve vídeo e expôs em redes sociais. Não se destacará aqui, a fala pouco convincente, insegura e recheada por um desempenho gestual de jogral de 4ª série primária. No entanto, é preciso reconhecer que o “espírito” da fala foi acertado.
Qual foi a intenção? Dizer que o governo apoia a investigação; que ele, governador, “abriu todo o governo à disposição das autoridades” e, claro, como não poderia deixar de faltar em uma fala de Cameli, dizer que “quem não deve não teme”.
O vídeo foi um acerto pelas intenções que tenta apresentar. Mas é um vídeo cujo objetivo bem formulado parece não encontrar o interlocutor adequado. Falas de senso comum (“… quem não deve não teme…”; “… Todo homem público tem a obrigação de prestar contas ao povo, à Justiça e a Deus…”) ditas por um gestor abaixo do comum. Com uma ressalva: a polícia está longe de encontrar as portas de qualquer governo escancaradas. Com aval da Justiça, a polícia ou pede por educação ou arromba por dever.
Os erros da assessoria são mais perigosos. Já na sexta-feira e no sábado após a deflagrada operação, percebeu-se um movimento de cortesãos palacianos plantando uma percepção “econômica” da Operação Ptolomeu 3 em diversas redações regionais.
E qual seria a leitura “econômica”? O esforço do paço era relacionar as decisões do STJ a uma possível onda de demissões nas 15 empresas envolvidas nas supostas danações apontadas pela Polícia Federal. Ou demissões ou atraso no pagamento de salários. Ou seja: no olhar de alguns integrantes da corte, o insensível STJ não tem dimensão da realidade da nossa economia.
É um erro banal querer jogar a opinião pública contra as decisões da Justiça. Sem contar o fato que beira o delírio supor que o martelo da ministra Nancy Andrighi terá um barulho menor por conta das consequências econômicas às empresas supostamente envolvidas em crimes de corrupção e lavagem de dinheiro.
Ou alguém espera ouvir da ministra “Verdade, né, maninha?!! Eu não vou responsabilizar essas empresas [supostamente] envolvidas em crime contra a ordem tributária, peculato, organização criminosa, fraude em licitações, corrupção passiva, corrupção ativa e lavagem de dinheiro porque senão elas vão atrasar salários ou até mesmo demitir funcionários no Acre…!”? Alguém espera mesmo ouvir essa frase da ministra? Sério?
Por esse raciocínio, seja na operação Ptolomeu ou em qualquer outra Brasil afora, a Justiça só pode definir; só pode decidir em criminalizar empresários e gestores públicos envolvidos em crimes caso a decisão não tenha consequências econômicas. Se a Justiça assim não agir, estará sendo insensível. Então, tá.
Guardada a proporção, caso venha a ser confirmada a lista de falcatruas apresentadas pela PF, a Operação Ptolomeu seria a versão acriana da Lava Jato. Muito mais modesta, inclusive nas supostas traquinagens. Mas há um problema de essência que une as duas operações: a qualidade das relações econômicas.
Repetindo (para não ser acusado de pré-julgamento): caso sejam comprovadas as denúncias, a Ptolomeu expõe um capitalismo de compadrio, um neoliberalismo de barranco, tão velho e já tão conhecido da crônica política brasileira.