Antes de mais nada, vale entender que o rótulo “trophy wife” surgiu no Ocidente para descrever “mulheres escolhidas” sobretudo pela juventude e aparência, funcionando como símbolo de status de seu parceiro.
Contudo, se você acha que trocar o crachá pelo avental é um troféu de honra e motivo de grande orgulho e inveja para as outras mulheres, prepare-se: pode ser o elixir mais traiçoeiro que existe. Muitas mulheres se orgulham ou são convencidas a abandonar a profissão para cuidar da casa e dos filhos, convictas de que alcançaram o ápice do status feminino. Mas, quando o casamento desanda ou o querido falece, o que sobra desse prestígio? Geralmente, apenas um vazio cheio de boletos acumulados.
Ao sair do mercado de trabalho, na maioria dos casos, deixa-se de recolher contribuição previdenciária. Parece detalhe, mas na hora da aposentadoria, da viuvez ou de um divórcio, isso vira um rombo que ninguém paga por você. E o pior: os estudos, que poderiam ser seu passaporte de volta à independência, ficam empoeirados na estante. Em vez de trocar ideias com colegas de profissão, você troca receita de bolo e conversa de corredor de festa infantil — divertido, sim, mas sem projeção de carreira ou perspectiva de futuro financeiro promissor.
O feminismo atual, ao contrário do que muitos pensam, não recrimina a opção de mulheres que se dedicam exclusivamente a sua família, mas desde que isso possa ser feito com liberdade de escolha e, o mais importante, sem ter de enfrentar um futuro incerto e inevitável instabilidade financeira.
Assim, se você realmente deseja se manter longe do mercado de trabalho e dos estudos para se dedicar exclusivamente a sua família, faça apenas como opção e não por obrigação e não se esqueça de que isto é também um trabalho, portanto precisa recolher sua contribuição social para que, em um momento de ausência de solidez financeira de seu parceiro, viuvez ou de uma separação inoportuna não acabe saindo da relação totalmente desamparada.
Como manter a autonomia sem abrir mão do afeto
Como feminista apoio a liberdade de escolha desde que você tenha alguns cuidados como:
1. Mantenha pelo menos um curso online ativo;
2. Faça ou reforce seu inglês ainda que na modalidade online;
3. Separe um tempinho semanal para projetos que estimulem seu currículo, existem cursos gratuitos na internet e alguns muito interessantes fornecidos pelo próprio site .gov;
4. Se é o seu parceiro quem está exigindo, peça a ele que pelo menos lhe garanta alguma fonte de renda individual, afinal, ficar “pedindo” dinheiro para comprar até uma calcinha não é tão legal em nenhuma relação, pois cria uma dependência gigantesca e pode virar motivo de brigas;
5. Contribua financeiramente ao INSS, se for sua opção, nem que seja na categoria facultativa, se for exigência dele, exija a contribuição melhor possível, afinal é o trabalho mais invisível e ingrato do mundo, pois só notam quando ele falta.
Desse modo, você garante um pé de meia na hora do aperto ou ao menos no mundo profissional, mesmo estando dentro de casa de chinelos.
Panorama Global: Como Diferentes Culturas Veem as “Esposas Troféu”
Nas Redes Sociais Globais o termo utilizado é “Tradwife”, em tradução livre, esposa tradicional, sendo uma verdadeira volta ao modelo dos anos 50: casa impecável, maquiagem e roupa sempre perfeita, submissão religiosa e moral. Este fenômeno reúne mais de 30 mil publicações na hastag #traswife, com diversas influenciadoras exibindo rotinas tradicionais conservadoras e sofrendo intenso julgamento de quem não concorda.
Mas como cada região do mundo adota ou desafia essa ideia de “sucesso”?
Nos EUA e na Europa o termo usado é “Trophy Wife” e ganhou força nos anos 1980 em revistas e séries de TV, mostrando a esposa, geralmente bem mais jovens, como um acessório de luxo para homens bem-sucedidos. Elas geralmente sofrem uma imensa pressão estética, normalmente acabam com grande dependência financeira e emocional, passando por estigmas de extrema superficialidade.
Já no Oriente Médio a esposa já é tratada como símbolo de prestígio, tanto que a poligamia é legal em vários países reforçando a noção de que “mais esposas” significam mais prestígio. Mesmo assim, elas mantêm sistemas de apoio mútuo que atenuam a crise de vulnerabilidade financeira, porém com várias restrições religiosas e de liberdade individual.
Na Ásia Oriental não há a poligamia, mas as mulheres jovens que se casam com executivos sofrem enorme pressão para que equilibrem cuidado doméstico e tradições familiares. A pressão por harmonia familiar faz com que muitas mulheres adiem ou reduzam a atividade profissional após o casamento, criando longos hiatos na carreira, principalmente depois da maternidade.
A África não é diferente, pois algumas etnias reforçam laços tribais através de múltiplas esposas, em que pese elas tenham apoio em redes, possuem grande limitação à educação formal.
Por fim, a América Latina mostra uma versão mais híbrida, com forte influência americana, muitos resgatam o glamour da “trophy wife” em redes sociais, mas há um “mash-up” entre influências estadunidenses e valores locais, sem um marco cultural único. O debate está acirrado: alguns veem como escolha pessoal, outras como retrocesso na igualdade de gênero. O fato é que há um crescente debate entre autonomia e tradição, sem um movimento unificado. Muito polarizado em razão da política, o que traz um enfraquecimento no direito da mulher.
Malefícios físicos, psicológicos e sociais
A dependência financeira hoje é um dos elementos impeditivos para mulheres que sofrem agressão doméstica deixarem o ciclo da violência, por este motivo, movimentos feministas extremistas estão revendo seu posicionamento e observando que, mesmo sendo um aparente retrocesso a mulher se dedicar exclusivamente ao lar, sua escolha merece o devido respeito e acolhimento de suas colegas e, principalmente de proteção.
Hoje até mesmo o Poder judiciário brasileiro que antes concedia pensão alimentícia em favor de ex-cônjuges ou ex-companheiras apenas quando de sua incapacidade total ou parcial para o trabalho, está se mostrando sensível a esta situação de longa dependência econômica e financeira determinando que as pensões sejam concedidas para os casos em que o ex-cônjuge ou ex-companheiro as obrigou a se afastar da profissão para se dedicar exclusivamente ao lar.
Um convite a reflexão
Ser esposa ou mãe é incrível, mas não precisa ser exclusivo. Cultivar sua carreira e seu desenvolvimento pessoal não diminui o amor pelo lar — só evita que, um dia, você precise vender o anel para pagar até mesmo um mísero aluguel. Troféu de verdade é quem conquista segurança, seja no trabalho ou em direitos garantidos pela própria contribuição.
Antes de pendurar o diploma na parede da sala de jantar, pergunte-se: o quanto do seu brilho depende de outra pessoa? Se a resposta fizer seu coração gelar, talvez seja hora de retomar o controle da sua história. Afinal, troféus que valem a pena são aqueles que você conquista por si mesma — e não os que ficam empoeirados na sombra de outra vida.




