Em 10 de fevereiro, Moisés Ferreira Alencastro sentou-se no estúdio do Gazeta Entrevista para falar de cinema, diversidade e futuro. O tema era a 3ª edição do Festival Transamazônico de Cinema LGBTQIAPN+, mas, como sempre acontecia quando Moisés tomava a palavra, a conversa ultrapassou a programação cultural e tocou em questões maiores: direitos humanos, política internacional e o ativismo LGBTQIAPN+ no Acre.
À época, ao comentar o cenário global, Moisés foi direto ao abordar a ascensão de discursos conservadores e o impacto de figuras como Donald Trump.
“Retrocesso mesmo, de direitos. Ninguém quer nem mais nem menos, apenas os nossos direitos. (…) É tanta coisa no mundo para se discutir, tanta guerra, e ele está batendo no meio ambiente. (…) Mas toda ação tem uma reação, e a reação está sendo muito rápida também”, disse.
Um ativismo atento, firme e vivo no Acre
Ao trazer o olhar para o cenário local, Moisés também fez questão de reconhecer avanços e celebrar conquistas do movimento LGBTQIAPN+ no estado.
“A luta continua. O dado feliz da gente foi que saiu agora que não houve mais nenhum homicídio por homofobia. (…) O movimento continua forte, firme e atento. Estamos em um momento muito bom, tanto no nível nacional como aqui também”, afirmou.
As palavras revelavam um ativista maduro, consciente dos desafios, mas orgulhoso da trajetória construída ao lado de instituições, aliados e coletivos que, segundo ele, ajudaram a garantir direitos e reduzir a violência.
O cinema como ferramenta de transformação
Na mesma entrevista, Moisés falava com entusiasmo do Festival Transamazônico de Cinema LGBTQIAPN+, realizado em Rio Branco e Cruzeiro do Sul, com programação gratuita e aberta ao público. Idealizador do projeto, ele via na arte um caminho para ampliar diálogos e promover mudanças sociais.

O festival reuniu curtas, longas-metragens e oficinas, além da presença de ativistas e representantes de instituições ligadas à defesa dos direitos humanos, consolidando-se como um espaço de visibilidade, escuta e resistência.
Uma trajetória marcada pelo afeto e pelo compromisso
Advogado, colunista social, ativista cultural e servidor do Ministério Público do Acre (MPAC) há mais de 19 anos, Moisés era reconhecido por sua atuação firme e, ao mesmo tempo, afetuosa. Ingressou no MPAC por volta de 2006 e, ao longo da carreira, tornou-se uma referência na cultura e na defesa da diversidade no estado.
Sua morte, aos 59 anos, provocou comoção em todo o Acre e mobilizou manifestações de pesar de autoridades, instituições e amigos, que o lembraram como uma figura essencial para a memória social acreana.

Relembre o caso
Moisés foi visto pela última vez no domingo (21). Após perderem contato, amigos e colegas iniciaram buscas. O sinal do celular indicou localização no bairro Eldorado, em Rio Branco. Diante da ausência de respostas, o MPAC autorizou o arrombamento do apartamento onde ele morava.
O corpo foi encontrado deitado sobre a cama, na noite de segunda-feira (22), com ferimentos causados por faca. O óbito foi confirmado pelo Samu. A área foi isolada pela Polícia Militar, e o corpo recolhido pelo Instituto Médico Legal (IML). O caso segue sob investigação da Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP).



