21 de setembro é o Dia Nacional de Luta da Pessoa Portadora de Deficiência
O capacitismo é uma forma de preconceito contra pessoas com deficiência, que envolve uma preconcepção sobre as capacidades que uma pessoa tem ou não devido a uma deficiência, e geralmente reduz uma pessoa a essa deficiência. Nesta terça-feira (21), é lembrado o Dia Nacional de Luta da Pessoa com Deficiência.
“Tal como ocorre com o racismo, o sexismo e as discriminações contra a população LGBTQIA+, o capacitismo é estrutural na sociedade brasileira. Ele está arraigado em quase todas as nossas práticas cotidianas. São atitudes capacitistas, por exemplo, presumir que uma pessoa com deficiência seja incapaz de realizar qualquer atividade que as ditas pessoas normais realizam. É fato que o modo como algumas pessoas com deficiência realiza atividades pode não ser o mesmo que outras pessoas sem deficiência realizam, mas, nem por isso, elas deixam de realizar ou as fazem de maneira errada e incompleta. Lembremos que todos nós realizamos atividades de vida diária de acordo com as nossas possibilidades”, define o cientista social Julian Simões, pós-doutorando na Universidade Federal de São Paulo.
Outro exemplo de atitude capacitista é a construção de ambientes pautados em apenas uma experiência corporal considerada a normal, a desejável e a saudável, completa Simões, que é membro do Comitê Deficiência e Acessibilidade da Associação Brasileira de Antropologia.
“Temos uma série de edifícios com portas de entrada, por exemplo, que dificultam o acesso de pessoas com cadeiras de rodas, pessoas com mobilidade reduzida, pessoas com crianças de colo, pessoas gordas, enfim, pessoas que não se encaixam na referida e excludente normatividade que atribui valor a alguns corpos como normais. Construir uma entrada específica para pessoas com deficiência, por exemplo, é capacitista, uma vez que reconhece a especificidade do corpo, mas atribui a essa especificidade um valor negativo indicando que tal corpo não se encaixa no que é considerado normal e que todas as pessoas fazem.”
A solução para este caso, ele sugere, “é projetar uma entrada única que seja capaz de contemplar pessoas em cadeiras de rodas, pessoas com crianças de colo, pessoas com deficiência visual, surdas ou com deficiência auditiva, bem como pessoas com mobilidade reduzida, gordas e pessoas sem deficiência”. “É um esforço de desenho universal. Ou seja, não será preciso uma entrada específica para as pessoas sem deficiência – tomadas como as normais – e outra específica para pessoas com deficiência – tomadas como anormais”, completa.
O cientista social chama atenção para as expressões linguísticas segregacionistas adotadas no dia a dia. “A expressão “idiota e retardado” para colocar em xeque as manifestações de lógica e de raciocínio de alguém é um desses exemplos. Outros exemplos são: a expressão “mancada” para falar de deslizes nas condutas, uma vez que não mancar, segundo o que se crê popularmente, é considerado a atitude “normal e desejável” dos corpos sem deficiência; a expressão “não ter braços ou pernas suficientes” para quando queremos dizer que temos muitas tarefas a fazer e uma grande dificuldade para realizá-las por falta de contingente de pessoas; as expressões “está surdo?” ou “está cego” para questionar uma pessoa que, por algum motivo, não entendeu o que se comunica, seja por conta das barreiras sociais a ela impostas, seja porque adota outras formas de perceber o mundo social que a cerca”.
Simões completa que o capacitismo está relacionado a uma série de expressões naturalizadas como isentas de preconceito e discriminação, mas que guardam em comum uma concepção segregacionista que toma uma manifestação corporal como sendo a normal, a desejável e a perfeita. “Pesquisadoras e pesquisadores do tema estão chamando essa atitude de corponormatividade, ou seja, um conjunto de normas e regras que visa regular corpos diversos a partir de referências de corpos considerados normais e saudáveis.”
Quem está no mercado de trabalho e tem alguma deficiência sente mais o capacitismo, explica a psicóloga Andréa Chaves. “Nas organizações de trabalho isso é mais frequente, eu acredito. Frases do tipo: ‘Dar uma de João sem braço’, ‘Parece cego em tiroteio’, ‘Agindo assim parece um autista’. Essas frases demonstram claramente a necessidade de rebaixar o outro, com comparações pejorativas. No mercado de trabalho, isso é frequente e parece inofensivo, quando na verdade é um modelo adoecido de estabelecer comparações.”
Na visão da psicóloga, o capacitismo no Brasil atinge principalmente os profissionais com deficiências que podem ser de natureza física, auditiva, visual, intelectual e também deficiências múltiplas. “O capacitismo é a falácia de que alguns seres humanos são inferiores a outros, em razão de alguma de suas características. E no Brasil infelizmente existe um emparelhamento de capacidade laboral x habilidades físicas.”