Ousada, sensual e completamente hipnotizante. Com letras que, acima de tudo, escancaram o amor-próprio, é indiscutível o impacto de Marina Sena no atual cenário da música brasileira.
A artista, como promessa ou manifesto, fez sucesso De Primeira (2021), após passar por diferentes bandas ao longo da sua trajetória. Em 2023, voltou com sons experimentais, uma estética futurista industrial e, acima de tudo, com libido altíssimo em Vício Inerente (2023). Agora, a menina de Taiobeiras chega explorando as percussões e ritmos hipnotizantes das Coisas Naturais (2025), em seu terceiro álbum de estúdio.
Conheça ou não, goste ou não, hoje vamos desmembrar o novo álbum faixa a faixa e falar um pouco sobre o que, para alguns, pode ter sido a consolidação da artista na cena popular brasileira, e, para outros, um trabalho vazio em comparação aos anteriores da cantora.

Coisas Naturais – 7/10
O peso de uma faixa-título de um álbum é indiscutível. Coisas Naturais se consolida como a primeira da carreira de Marina Sena, mas, apesar de ser uma das mais experimentais do álbum, é também a menos memorável.
Sem ponte e com um refrão nada marcante, onde os batuques e os vocais de fundo sintetizados sustentam, ao menos, os versos da música, a faixa tem um único diferencial: suas flautas transversais, que fazem um percurso na cabeça do ouvinte.
Já as letras, simplórias, trazem um tom de introdução ótimo para o início do álbum. E, na questão lírica, Marina nunca erra. Coisas Naturais é uma música com muito potencial, mas nada além disso. Em comparação a outras do álbum, acaba sendo esquecida no churrasco!
Numa Ilha – 10/10
Um hit é hit! Tudo o que a faixa-título tentou ser, o primeiro single do álbum Numa Ilha faz com perfeição, demonstrando tanto toda a atmosfera do álbum quanto te levando, não ironicamente, a fazer uma viagem até a ilha que reside na cabeça de Marina Sena.
Com flautas e um ritmo digno de dançar coladinho, a música, extremamente romântica, te conduz com gosto por uma hipnotizante adrenalina. Aqui conhecemos a Marina apaixonada, com letras cruas e uma voz que, às vezes, beira o falado.
A música constrói metáforas e analogias de alguém que só quer passar um tempo em uma ilha com a pessoa que ama e orbitar a lua enquanto se entregam ao sentimento. Já o final… sem palavras. Só não dou 11 porque, se essa parte experimental tivesse se estendido, eu escutaria por horas.
Desmitificar – 10/10
Completamente impecável, e ainda digo mais: uma das melhores da carreira! Se você gostou do final de Numa Ilha, Desmitificar é um prato cheio. Extremamente experimental, distorcida e, acima de tudo, ritualística, Desmitificar é um chamado para transcender e encontrar o novo.
A letra relata a história de um caso em que o eu lírico quer ajudar seu parceiro a ir além do que aprendeu sobre relacionamentos. Com um ritmo extremamente acelerado, dá vontade de sair pulando, é quase um nível de bruxaria. E o que dizer da parte final: “Vou fazer um carnaval na sua vida tão sem sal”? É aqui que o amor-próprio de Marina Sena começa a dar as caras para abrir passagem à faixa final.
O ouvinte sente vontade de sair da zona de conforto e se confrontar com o novo. Marina Sena foi artista nessa faixa: com batuques e uma percussão de respeito, a cantora, que também foi produtora da música, mostrou versatilidade e inovação.
Anjo – 9.5/10
Marina Sena sempre deixou claro que uma das suas maiores inspirações é Gal Costa. Em Anjo, ela praticamente incorpora a artista, trazendo timbres e tons que até se confundem com os de Gal!
Anjo é extremamente linda. O início com voz e violão se desdobra em um ritmo com instrumentos de sopro, digno de um clássico brasileiro dos anos 90. A música fala de um amor em que ela não quer se sentir presa, apesar de gostar muito do seu “anjo”.
A faixa se destaca das outras pelo seu pré-refrão, onde Marina explora seu vocal suave, agudo e leve, conduzindo o ouvinte a um refrão explosivo. Apesar dos muitos elogios, acho que a faixa se destoa um pouco da premissa do álbum, sendo a coisa mais “natural” da música o grito de Marina no final. Ainda assim, é indiscutivelmente uma música extremamente boa (talvez funcionasse ainda melhor em um álbum vanguardista).
TOKITÔ – 7.5/10
Trazendo a participação de Gaia e Nenny, duas artistas internacionais, TOKITÔ prometia ser uma música divisora de águas na carreira de Marina Sena, ao mirar em uma possível quebra de fronteiras, mas acaba sendo apenas básica.
Com uma espécie de afrobeat que carrega a música nas costas, a escolha de Marina de cantar apenas o refrão pode ter feito a faixa passar despercebida, com versos pouco memoráveis. É definitivamente uma música, mas nada além disso.
Sem Lei – 9.5/10
Saudosista! Marina Sena consegue deixar claras suas influências sem precisar de entrevistas sobre suas inspirações! Assim como Anjo, Sem Lei traz versos que te animam para um refrão centrado e envolvente, com um coral que te faz se sentir na Copacabana dos anos 90.
Nem tanto quanto Anjo, mas também foge da percussão estridente que é uma das premissas de Coisas Naturais, se sustentando no refrão de poucas palavras! Só não dou uma nota maior devido a um problema que considero constante na artista, que é a escolha de títulos pouco marcantes para suas músicas.
SENSEI – 9/10
As polêmicas envolvendo a voz de Marina Sena sempre foram presentes em sua carreira. SENSEI é uma obra-prima, tanto em sua produção, que te introduz na atmosfera do álbum, quanto na experimentação em seus vocais!
Trazendo o amor-próprio e uma pá de terra na paixão do eu lírico, Marina se sai muito bem em registros graves. O único defeito dessa música é a ausência desses registros nesta faixa densa e emotiva! O refrão, com efeitos que remetem ao fogo, traz um ambientalismo digno de Coisas Naturais.
Lua Cheia – 10/10
Imagina misturar Frutiger Aero com uma pegada de forró! A combinação que ninguém imaginava que fosse dar certo resultou em Lua Cheia, uma das melhores do álbum.
Com um leve ritmo de pisadinha, Marina aparece novamente apaixonada e, dessa vez, num ritmo pra dançar coladinho, com uma letra de se apaixonar! Com solos que fazem história, não tem muito o que se falar: é boa porque é boa!
Combo da Sorte – 10/10
Combo da Sorte traz guitarra e reggae, trazendo um tom de mistério digno de James Bond e Marijuana. Marina trouxe a paz e chamou você para viver um amor que te hipnotiza, assim como os sons de fundo do refrão.
A guitarra, que assumia um mistério de James Bond no início, se torna uma trama de faroeste! É uma música que passa por vários locais e te ambienta em cenas quase reais! Extremamente boa!
Mágico – 7.5/10
Trazendo saudosismo novamente, mas dessa vez quase como um descarte do Tim Maia, Mágico é animada e traz um ritmo contagiante, mas nada além disso! Ela é tão doce, carismática e alegre que pode enjoar fácil.
O uso e abuso de instrumentos de sopro fazem dela marcante para quem viveu em uma época onde a utilização desse instrumento era algo inovador. Não é ruim, mas também foge um pouco de Coisas Naturais e se encaixa mais nesse vanguardismo.
Doçura – 9.5/10
Todos querendo essa cura, Marina! A música mais sensual do álbum, traz como participação Çantamarta e um clima meio latino, onde você vira quase um toureiro, misturando com uma escala árabe ao final da música.
Marina te chama pra ser curado e escancara seu amor próprio ao dizer que é a própria cura. Você se sente uma serpente sendo encantada por ela!
CARNAVAL – 10/10
Como disse, o registro grave de Marina Sena é um dos seus pontos altos de sua carreira. Em CARNAVAL, a cantora explora sua voz nesse tom de forma única e traz à tona um funk quase falado de forma sensual e cativante.
Impossível ficar parado! Com uma produção de certa forma simplista, CARNAVAL se destaca por trazer outro viés de percussão e te preparar para dançar muito!
Ouro de Tolo – 10/10
Chegamos no ápice do álbum, e infelizmente, na finalização. O que aparece, de início, pode parecer estranho ou diferente até demais, devido à sua estrutura não convencional. Ouro de Tolo é uma carta aberta ao amor próprio e à valorização de si mesmo. Marina se faz tão grande nessa música que deixa o ouvinte pequeno e regido pela presença dela! Ela é um astro, um sol!
A música fala sobre alguém que, após um relacionamento, entende que o principal amor vem dela mesma e que ela é suficiente. Uma ópera com samba que se desdobra em batidas sintetizadas e um poema avassalador, onde você se questiona se é merecedor de estar no mesmo plano astral que a artista. Ouro de Tolo é o ápice artístico de Marina, e assim como Santo e Pra Ficar Comigo, finaliza muito bem o álbum!
Álbum Coisas Naturais, de Marina Sena – 9.19
Marina Sena é conceitual e estética acima de tudo: uma praia, pés descalços, percussão, flautas… Neste álbum, apesar de pequenas incoerências que poderiam ocasionar um álbum vanguardista em homenagem a artistas brasileiros dos anos 90, Coisas Naturais se sustenta com muita paixão, dança, uma capa sensacional e, acima de tudo, amor-próprio!
O álbum fecha minha avaliação com 9,19, o que deixa claro que Marina Sena chegou para ficar. E, apesar de, em minha opinião, não ser o melhor trabalho da cantora, está longe de ser algo ruim!
