Por Andressa Queiroz da Silva
No mês de julho, especificamente no dia 25, foi o Dia da Mulher Negra Latino-americana e Caribenha, instituído pela ONU, e no final do referido mês começou os Jogos Olímpicos de 2024 que está sendo sediado na França. Neste texto objetivo realizar reflexões acerca desses fatos, afinal temos visto que são as mulheres negras, em sua maioria, que estão conquistando para o Brasil as medalhas nessa edição dos jogos.
Como tinha falado em um texto anterior intitulado “Entre campo e a política: futebol também é sobre as resistências”, publicado aqui na Coluna Antirracismo Em Pauta, não há como separar esporte e política, afinal tudo é político! Dessa maneira, temos que destacar o gênero e a raça das grandes vencedoras brasileiras das Olimpiadas de 2024. São elas: a judoca e ganhadora da primeira medalha de ouro, Beatriz Souza; a mais jovem da história a ir ao pódio em duas Olimpíadas diferentes, a skatista maranhense Rayssa Leal; e na ginástica artística Rebeca Andrade (com três medalhas: ouro no Solo, prata na categoria individual geral, prata no salto e bronze na categoria por equipes – junto com Jade Barbosa, Júlia Soares Flávia Saraiva e Lorrane Oliveira).
Acredito que é consenso que o grande destaque dessa edição tenha sido Rebecca Andrade e a estadunidense Simone Biles, que mesmo estando diante de uma competição fizeram uma disputa acirrada, mas o mais importante, respeitosa. As duas foram várias vezes flagradas em um clima amistoso e de respeito uma à outra. É inegável que a atuação de ambas e de outras atletas negras são preponderantes para que elas saiam das margens, da subalternização e sub-representação, para o centro, mostrando a forte atuação das mulheres negras no esporte.
Além disso, pela primeira vez a delegação brasileira é formada por um maior quantitativo de mulheres, elas são 153 dentre os 276 atletas, o que corresponde a 55%. Esse número é expressivo diante de uma estrutura patriarcal e desigual que culturalmente e historicamente não incentiva meninas e mulheres na prática de esporte ou ainda a praticarem apenas determinados esportes, os considerados “mais femininos”.
Além disso, gostaria de destacar também o papel de projetos sociais para pensar em um futuro promissor no esporte, mas também na educação, em nosso país. A falta de incentivo e investimento no setor no “país do futebol” foi consenso, denunciado desde a ausência de patrocínios para alguns atletas até o cuidado com uniformes oficiais pelo Presidente do Comitê Olímpico Brasileiro, Paulo Wanderley.
Mas, além de ser palco de conquistas, quebra de recordes e para as belas atuações, a Olimpíada de 2024 também foi marcada como racismo, xenofobia e misoginia. Gostaria de destacar e tecer comentários sobre alguns pontos.
Rebecca foi alvo de críticas e de um jornalismo tendencioso da Veja com a seguinte notícia “Rebeca já recebeu R$ 1,3 milhão do Bolsa Atleta”. A notícia divulgada influencia o leitor a desmerecer as conquistas de Rebecca por ela receber ao longo de 12 anos de dedicação ao esporte o valor divulgado.
Além disso, Simone foi criticada por estar com os cabelos “desarrumados” durante a disputa, expondo o racismo e o ódio gratuito que a atleta recebe, mesmo sendo uma das melhores na sua categoria, é desconsiderado toda sua trajetória de excelência na ginástica para dar atenção a um fator nada relevante.
Atletas negros, em específico mulheres, sabem como o racismo e a misoginia influencia negativamente suas vidas, dificultando e colocando entraves em suas trajetórias e por isso sabem também a importância de sua representatividade e conquistas diante desse cenário. Em entrevista, a judoca Beatriz Souza desabafa “Pretas e pretos do mundo todo, acreditem. Às vezes a gente acha que pode tá pagando muito caro, mas vale cada centavo quando a gente conquista o que a gente quer!”.
Sobre o tema, a ex atleta e agora comentarista da Olimpíadas de 2024, Daiane dos Santos afirmou que “Rebeca falou sobre representar a todos. Sim, ela representou a todos, mas ser a representatividade de 56% de uma nação, que é excluída, que é subjugada, que muitas vezes quando ganha ela é pertencente. E quando não ganha?”, o comentário denuncia o racismo que atletas negras sofrem quando os resultados não são positivos.
Concluo esse breve texto reafirmando que nós mulheres negras estamos reescrevendo nosso futuro e que devemos sim celebrar a conquista que temos alcançado em diversos espaços, sendo o esporte apenas deles. Nós, temos plena consciência de que não chegamos ou chegaremos ao topo sozinhos, mas somos resultado de passos dados por outros e outras que vieram antes de nós, que foram existência e resistência.