Por Queila Batista
Nesse ano de 2024, pela primeira vez no Brasil o dia 20 de novembro será feriado nacional. Esse dia já estava como feriado no calendário oficial de vários estados brasileiros, pois cabia aos municípios e estados adotarem ou não o feriado em seus calendários locais. No nosso estado do Acre o dia 20 de novembro não era considerado feriado. Em 2011 a Lei 12.519/2011 institui o dia 20 de novembro no Brasil, como o Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra (BRASIL, 2011), porém não determina que o dia seja feriado nacional. A lei 14.759/2023, instituída pelo projeto de lei 3.268/2021, de autoria do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), modifica o calendário oficial brasileiro tornando o dia 20 de novembro, Dia da Consciência Negra e Dia Nacional de Zumbi dos Palmares, como uma data comemorativa e feriado nacional em todo território nacional (BRASIL,2023).
Comemorado desde 2003 em diversas cidades e estados do Brasil, o Dia da Consciência Negra nasce fazendo um contraponto a data 13 de maio, onde se discute a problemática abolição da escravatura na sociedade brasileira, vem o dia 20 de novembro na perspectiva de se reconhecer o legado e a contribuição da população negra na constituição da nação brasileira. O dia 20 de novembro é considerado também o dia de Zumbi dos Palmares, uma figura símbolo de resistência contra a escravidão, que liderou o Quilombo dos Palmares, considerado o maior no período colonial do Brasil.
No calendário escolar brasileiro o Dia Nacional da Consciência Negra foi incluindo pela Lei 10.639/2003, que alterou a Lei de Diretrizes e Base da Educação Escolar (LDB). A referida lei também estabeleceu a obrigatoriedade do ensino da história e da cultura afrobrasileira e africana na Educação Básica. Cabe ressaltar que a lei foi resultado de uma longa luta do Movimento Negro brasileiro, que reivindicava a valorização da história e cultura dos afrodescendentes nos currículos escolares. Nesse sentido a lei surge para resgatar a contribuição dos povos africanos na cultura brasileira, mostrar a história dos negros no país numa perspectiva positiva evidenciando sua luta antirracista, e evidenciar as contribuições dos diferentes povos e etnias na construção identitária da nação brasileira, discutindo o silenciamento e epistemicídio por qual passou o continente africano.
Para o Movimento Negro, o Quilombo, na história brasileira ocupa lugar de destaque e representatividade, pois esses espaços de resistência à escravidão, onde os escravizados eram livres e podiam viver de acordo com suas culturas, foi transformado em símbolo de resistência e luta.
Beatriz Nascimento (2007), traz o Quilombo como contínuo de luta para o resgate identitário do ser, ela retoma a partir das heranças africanas o Kilombo, organizações angolanas de luta pela sobrevivência e resistência contra escravização. O Quilombo surge da pessoa que não aceita ser propriedade de outro e foge, na busca por território e libertação. A autora traz em seu sentido mais amplo o Quilombo como um “estado da coisa”, um estado de agência, associação e vida comunitária. Nesse sentindo de resistência, o Quilombo de Palmares tornou-se um representante dos vários quilombos existentes no Brasil, e sua história exaltada pelo Movimento Negro o transformou em referência simbólica para as lutas e reivindicação dos negros no Brasil.
É no Quilombo de Palmares que temos a figura de Zumbi, heroicizado na história brasileira, representando todos os que lutaram contra a escravidão. Os “herdeiros” das terras quilombolas, tornaram-se conectados com a história da escravidão no Brasil, e essa ligação inspirou o Movimento Negro, a utilizar o quilombo como símbolo de resistência e bandeira de luta contra o preconceito racial. O grupo Palmares criado em 1971 em Porto Alegre no Rio Grande do Sul, foi responsável pela ideia incorporada pelo Movimento Negro Unificado Contra a Discriminação Racial (MNUCDR) posteriormente do “deslocamento das comemorações do treze de maio para o vinte de novembro” (GONZALEZ; HASENBALG, 1982, p. 31).
Que neste dia 20 de novembro de 2024, feriado nacional, possamos viver o aquilombamento de Beatriz Nascimento, comemorando o Dia da Consciência Negra e de Zumbi no Brasil, mas que também façamos um dia de luta pela igualdade racial no país. Lembremos a escravidão negra no Brasil depois de mais três séculos de vigência acabou, mesmo que para muitos de nossos irmãos que foram escravizados seu fim era impensável, nesse sentido seguimos almejando e buscando o fim do racismo no Brasil, sigamos! Viva o Dia da Consciência Negra! Viva Zumbi! Viva o povo negro! Viva! Vida!
Referências:
BRASIL. Lei nº10.639/2003, de 9 de janeiro de 2003. Altera a lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da Rede de ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira”, e dá outras providências. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/l10.639.htm#:~:text=L10639&text=LEI%20No%2010.639%2C%20DE%209%20DE%20JANEIRO%20DE%202003.&text=Altera%20a%20Lei%20no,%22%2C%20e%20d%C3%A1%20outras%20provid%C3%AAncias>Acesso em 16 de novembro de 2024.
________. Lei nº 12.519/2011, de 10 de novembro de 2011. Institui o Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12519.htm> Acesso em 16 de novembro de 2024.
________. Lei nº 14.759/2023, de 21 dezembro de 2023. Declara feriado nacional o Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2023-2026/2023/lei/l14759.htm>
GONZALEZ, Lélia; HASENBALG, Carlos. Lugar de negro. Rio de Janeiro, Marco Zero, coleção 2 pontos, v3. 1982.
NASCIMENTO, Beatriz. O Conceito de Quilombo e a Resistencia Cultural Negra. In. RATTS, Alex. Eu Sou Atlântica. Sobre a Trajetória de Vida de Beatriz Nascimento. São Paulo. Instituto Kuanza/Imprensa Oficial. 2007.pp. 117-124.
Graduada em Licenciatura em História pela Universidade Federal do Acre (2011). Especialista em História do Brasil pelo instituto Prominas (2016). Mestra em Letras – Linguagem e Identidade pela Universidade Federal do Acre (2018). Assessora Pedagógica na Divisão de Educação em Direitos Humanos e Diversidade da Secretaria de Estado de Educação, Cultura e Esportes do Acre – SEE, Pesquisadora da Associação Brasileira de Pesquisadores (as) Negras (as) – ABPN. Pesquisadora da Associação Nacional de História – ANPUH. Integrante do Núcleo de Estudos Afro-brasileiros e Indígenas da Universidade Federal do Acre (Neabi/Ufac).