Por: Israel Souza
Aqui no Acre, está marcado um evento em defesa da anistia dos envolvidos na tentativa de golpe do 08 de janeiro. Uma micareta golpista voltada para abonar criminosos!
Mesmo a contragosto, os entusiastas do evento assumem que os apenados pela tentativa de golpe são criminosos. Por isso, não pedem sequer julgamento justo (o que já têm, diga-se de passagem), direito à ampla defesa ou coisa assim. Não. Temendo o desfecho dos processos judiciais, pedem logo anistia, o que os leva a reconhecer, portanto, que são culpados, que são criminosos.
Em segundo lugar e em decorrência disso, com esse tipo de ato, estão mantendo viva a chama golpista, pois que, tentando livrar os algozes da democracia da merecida punição, laboram pela impunidade. E esta, caso tenha lugar nos processos referentes ao caso, fatalmente, representaria um sinal verde para presentes e futuros golpismos e golpistas.
Em razão disso, ou nossa justiça e nossa democracia saem mais fortalecidas, punindo quem merece ser punido, ou, por outro lado, saem debilitadas. Se for este o caso, sairiam numa condição tal que não inspirariam o menor respeito. Como se pode notar, o que está em curso não diz respeito apenas ao presente, mas ao futuro também.
Por força dessas e outras implicações, esse ato por anistia deveria envergonhar a todos e qualquer um com um mínimo de consciência política e de pudor. Embora não assumam, esse é, sem dúvida, um ato de quem tem “bandido de estimação”, uma manada deles, para ser mais preciso.
Não obstante, devemos ter presente que, para quem está à frente desse tipo de mobilização – sobretudo, no cenário nacional, mas não só -, pouco importa o peixe miúdo que até agora foi pego na malhadeira da justiça. Por trás dessa fachada “humanitária”, que contemplaria a todos os envolvidos, o que eles estão fazendo mesmo é defender de antemão o chefe da horda golpista, aquele que seria o principal beneficiário dos crimes.
Ora, cumpre dizer que os mentores do golpismo não estão usando seu poder político para defender pessoas como a dona Fátima de Tubarão. Na verdade, estão se valendo de pessoas como a dona Fátima de Tubarão para defender seu poder político. Em outras palavras, os que ontem serviram como bucha de canhão, para a tentativa de golpe, servem ainda hoje como bucha de canhão. Dessa feita, para que os artífices do golpismo se salvem das penalidades mais que merecidas.
Bucha ontem, bucha hoje. Provavelmente, bucha amanhã. Os que se beneficiariam do golpe nunca se preocuparam, não se preocupam nem se preocuparão com os peixes pequenos. Fosse assim, ao ter perdido as eleições, Bolsonaro teria reconhecido a derrota e teria falado para seus seguidores saírem das ruas e da frente dos quartéis, que voltassem para suas casas. Não foi o que ele fez. Ao contrário, encorajou-os a permanecer mobilizados.
E assim fizeram conscientes de que incorriam em crimes. Informado pelos militares, Bolsonaro sabia que as urnas eletrônicas eram seguras e que nada havia que apontasse para fraude no sistema eletrônico de votação[i]. Sustentaram a farsa propositalmente. Por seu turno, Mauro Cid e outros militares sabiam que estavam incorrendo em crimes[ii].
A cúpula golpista tinha medo da prisão[iii] e, por tudo que já vimos das investigações, tinham razões de sobra para tal. Também, pudera! Jogaram-se de corpo e alma no lamaçal do golpismo. Não obstante, estimulou a plebe golpista a continuar na frente dos quartéis. Maldade proposital contra seus próprios apoiadores!
Em certo sentido – um sentido bastante perverso -, o mal que os peixes pequenos agora sofrem serve como um bem para os peixes grandes do golpismo. Sim. E é por essa razão, alegam alguns, que gente vinculada a esses líderes está orientando os presos a não fazer acordo com a justiça para diminuir suas penas[iv]. É importante que permaneçam presos, para que os líderes do golpismo façam alarde e drama em torno de sua situação, procurando gerar comoção social.
Que façam sua festa, carnaval em defesa de criminosos. De cá, do lado da democracia, sabemos: é uma festa tocada pelo cinismo e pelo desespero. A justiça está nos seus calcanhares. Temem porque devem.
Um tanto hipocritamente, eles diziam antes: Bandido bom é bandido morto. Nós, porém, dizemos: Bandido bom é bandido preso! Golpista bom é golpista preso! Essa é diferença entre nós e eles, entre quem luta pela justiça e quem só vomita estupidez e ódio.
Nossa festa começará quando o julgamento tiver fim, com a justa punição dos responsáveis. Riremos por último, um riso livre, farto e melhor. Um riso democrático.
SEM ANISTIA PARA GOLPISTA!!!!!
Professor e pesquisador de Instituto Federal do Acre/Campus Cruzeiro do Sul. Autor dos livros Democracia no Acre: notícias de uma ausência (PUBLIT, 2014), Desenvolvimentismo na Amazônia: a farsa fascinante, a tragédias facínora (EDIFAC, 2018) e A política da antipolítica no Brasil, Vol. I e II (EaC Editor, 2021) e Ciência, educação e política, Vol. I e II (EDIFAC, 2024).
[i] Bolsonaro e aliados sabiam não haver fraude nas urnas eletrônicas em 2022, diz denúncia da PGR | Política | Valor Econômico
[ii] A mensagem que prova que Mauro Cid sabia que estav… | VEJA
[iii] “Medo de ser preso“: militar cita recuo de Bolsonaro sobre minuta do golpe | CNN Brasil
[iv] Barroso diz que parte dos réus do 8 de janeiro não aceitou acordo para substituição de penas por ‘manifestação ideológica’