Histórias de vida de quem perdeu quase tudo
Jena Codelis é uma das últimas imigrantes haitianas a chegar no Brasil. A estudante de medicina, depois de não conseguir mais pagar o curso universitário, decidiu fazer as malas para tentar uma vida melhor por aqui.
Jena conta que estudava em um dos poucos espaços da universidade que não haviam ruído depois do terremoto. “Está praticamente tudo devastado, ficou precário”, relata. Assim como na instituição, a maior parte de Porto Príncipe, capital do Haiti, ainda está em ruínas. Regularizando a documentação, a jovem viaja para Santa Catarina, onde o irmão está morando.
Assim como Jena, dezenas de haitianos chegam no Acre quase todos os dias. Na Capital, onde está instalado o abrigo, os imigrantes emitem documentos e ficam regularizados no país pelo prazo de cinco anos, com direito a trabalho.
Desde 2010, aproximadamente 30 mil imigrantes passaram pelo Acre, sendo a maioria haitianos. O fluxo migratório é constante. Para se ter ideia, na semana passada, partiram de Rio Branco onze ônibus lotados. Cerca de 500 estrangeiros buscando a sorte no país. Há duas semanas, o abrigo atendia quase 800 pessoas, hoje o espaço está praticamente vazio, com apenas 183 imigrantes.
Entre a população do abrigo está Sadraque Ferdinandi. Há 4 anos no Brasil, o haitiano se estabilizou. Só retornou ao abrigo para esperar o enteado que acabou de chegar do Haiti, mas precisa de autorização judicial em Brasiléia para seguir viagem.
Sadraque diz que o dia 12 de janeiro não tem como ser esquecido. Nessa data, no ano de 2010 o Haiti, e com maior intensidade Porto Príncipe, foi atingida por um forte tremor que, em menos de um minuto, estima-se que mais de 200 mil pessoas tenham morrido.
O terremoto principal registrou 7,3 graus na Escala Richter. O país sofreu ainda mais dois tremores com média de 5 graus. Sadraque perdeu 17 pessoas da família, entre pai, irmãos e avós. “Hoje me sinto muito triste. Se não tivesse acontecido isso teria ficado lá”, explica.
Sadraque é pedreiro em Cuiabá, capital do estado do Mato Grosso. Ganha, dependendo do mês, de R$ 3 a R$ 4 mil. A mulher dele também trabalha. Na função de serviços gerais, ajuda a complementar a renda familiar. Consegue mandar mensalmente pra família que ficou no Haiti, cerca de $ 700 (dólares).
Se por um lado os imigrantes estão conseguindo se estabilizar no país e o fluxo não para. O governo do Acre sente o custo de cumprir com a ação humanitária. Segundo a Secretaria de Direitos Humanos, por mês, o estado gasta aproximadamente R$ 100 mil com os estrangeiros. R$ 22 mil são destinados ao abrigo em Rio Branco.
Para o secretário da Sejudh, Nilson Mourão, é preciso consolidar a política migratória no Brasil. “Essa política ainda está muito frouxa, precisa de amarrações. Se for fronteira aberta, temos que ter um fluxo, ou seja, mandamos para onde, quem acolhe, onde vão trabalhar. Se for uma decisão firme de desativar a rota irregular, então vamos fortalecê-la”, disse.
Enquanto novas medidas diplomáticas não são aplicadas, os estrangeiros continuam desembarcando no Brasil, através das fronteiras acreanas. Embora possam encontrar problemas burocráticos, não vai ser mais difícil do que ter que viver no país que após cinco anos do abalo, continua devastado.