Querida Ivone,
É com imenso carinho que escrevo a você, neste mês que traz uma importante data para o Movimento Negro Brasileiro, o Dia do Samba dia 2 de dezembro. Que possamos refletir sobre a importância dessa expressão artística e de luta, que em meio as opressões racistas, se manteve viva, forte e brilhante no corpo e na alma do povo brasileiro.
Dentro dos vários debates, um dos significados de samba vem da palavra de origem africana semba1 palavra utilizada para se referir à dança de roda. Em seu sentido de original, o samba de roda era visto com profano, pois era realizado depois de cultos religiosos.
Ao longo de sua trajetória, do século 19 ao 21, o samba foi se reinventando e ganhando novas formas de expressarmos quem somos. Um grito da população negra, uma forma de expressar suas angústias, reinvindicações, religiosidades, amores e desamores, o seja, o seu dia a dia nas letras das músicas. Tornou-se um verdadeiro suco de brasilidade!
O ano de 1916 é o marco inicial do samba nas gravadoras, quando foi lançado “Pelo Telefone”2, de autoria de Enesto dos Santo, o Donga e Mauro de Almeida, o Peru dos pés frios. Um acontecimento que marca não apenas um ato de celebrarmos as alegrias, mas também as resistências do povo negro.
Posteriormente, nos anos 60, ocorreu o I Congresso Nacional do Samba, encontro esse que aprovou a Carta do Samba3, documento que traz em seu conteúdo a afirmação da luta contínua pela valorização da minha, da sua, da nossa cultura. E o Dia Nacional do Samba, celebrado no dia 2 de dezembro (data de encerramento deste congresso), tornou-se um ponto de encontro de corpos, mentes e vozes que ecoam nas vielas, favelas, morros, espaços culturais e de pesquisas de todo Brasil.
Recentemente foi aprovado a Lei n. 14.567, de 4 de maio de 2023, que reconhece as escolas de samba como manifestação da cultura nacional, reafirmando a importância da cultura afro-brasileira, mostrando um pouco da história do povo negro nas letras, melodias e nos batuques. O samba não é só música, é a voz da nossa luta, as letras celebram as vivências da nossa gente.
É bom recordar as palavras de Edison Carneiro na Carta do Samba: “O samba tem seu embrião no continente africano e veio na alma dos negros, para cá trazidos como escravos [escravizados]. Foi dos lamentos das senzalas que o samba foi tomando forma e foi se enraizando por todo o Brasil.”
Espero que esteja bem onde quer que esteja, minha amiga, que esteja alegrando as rodas de samba com sua bela presença e voz.
Com carinho,
Um aprendiz de sambista
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[1] FUNDAÇÃO BIBLIOTECA NACIONAL. Origens do samba – as influências das danças de umbigada. Disponível em: https://bndigital.bn.gov.br/exposicoes/ai-ai-ai-cem-anos-o-samba-faz/origens-do-samba-a-influencia-das-dancas-de-umbigada/#:~:text=A%20palavra%20samba%20procede%20da,roda%20de%20samba%20era%20profano. Acesso: 11 dez. 2025.
[2] VALERIABDINIZ. Pelo Telefone – Donga. Youtube, 02 dez. 2010. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=X99_DMzHPNg&t=68s. Acesso: 11 dez. 2025.
[3] CARNEIRO, Edison. Carta do Samba. Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular (Brasil). Rio de Janeiro: IPHAN, CNFCP, 2012. Disponível em: https://diepafro.ufu.br/sites/diepafro.ufu.br/files/media/document/carta_do_samba_web.pdf. Acesso: 11 dez. 2025

Jardel Silva França – Mestre em Letras: Linguagem e Identidade pela Universidade Federal do Acre (PPGLI/ Ufac). Professor temporário da área de História na Universidade Federal do Acre. Filiado à Associação Brasileira de Pesquisadores Negros e Negras (ABPN). Membro do Grupo de Pesquisa Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros e Indígenas da Universidade Federal do Acre (Neabi/Ufac).




