Muita gente viu as imagens da megaoperação no Rio e achou que o Estado finalmente “reagiu”. Blindados nas ruas, helicópteros sobrevoando as favelas e mais de cem mortos em um só dia. Mas, do ponto de vista econômico, o impacto disso é o mesmo que desligar o alarme de um prédio pegando fogo e achar que o incêndio acabou porque o barulho parou. A operação pode até dar a sensação de controle, mas não toca no que realmente sustenta o crime: o dinheiro. E, pior, custa caro.
O crime organizado funciona como uma empresa. Tem hierarquia, logística, fornecedores e fluxo de caixa. Quando o Estado elimina dezenas de “funcionários” de base, promove automaticamente os que sobram. O “RH” do crime é ágil, e o mercado paralelo continua aquecido enquanto o formal segue fechado para quem nasce nas margens.
Essas operações são como empresas que fingem resolver problemas demitindo o setor de atendimento, mas mantendo os mesmos diretores e o mesmo caixa. Nada muda na estrutura, só nos rostos. E, como toda organização, o crime se adapta rápido. Perde hoje, se reorganiza amanhã e volta a operar.
O prejuízo para a população, no entanto, é evidente. O comércio fecha, o transporte para, a escola não abre. O pouco dinheiro que circula nas comunidades desaparece por medo ou bloqueio. O Estado gasta milhões em horas extras, combustível e munição para colher manchetes e discursos políticos. É como torrar o orçamento de uma empresa em um evento bonito para os acionistas, sem investir nada em inovação ou produtividade. E, enquanto isso, não há saneamento, educação, saúde nem moradia, apenas o espetáculo da força.
É importante olhar também para a cara da ação, para a cara da favela e da dor, pobre, preta e feminina, como já demonstrado nesta coluna, que mostra como essas pessoas vivem com rendimentos menores e menos oportunidades. E é preciso ver como o andar de cima usa o andar de baixo para fazer política e encenar eficiência. O custo humano, como o econômico, recai sempre sobre os mesmos.
Isso não é uma defesa da criminalidade. O crime deve ser combatido, e a favela deve ser um lugar bom para viver e sobreviver. Mas não é assim que se faz. Nenhum Estado se torna mais seguro empilhando corpos. O enfrentamento precisa sufocar o financiamento, cortar a lavagem de dinheiro, reduzir o acesso a armas e criar alternativas econômicas reais. Enquanto o Estado atacar sintomas e ignorar causas, continuará produzindo mais violência que solução, mais trauma que transformação.
Mais Carandirus que geraram revolta, e menos investimentos que poderiam gerar menos um jovem no crime e mais um jovem na universidade.
Como disse o deputado Nikolas Ferreira, talvez precisemos mesmo de mais Capitães Nascimento, não o do começo, mas sim o que, no fim do filme, percebe que o crime se combate na raiz. E essa raiz, muitas vezes, é política, é rica e não está na favela.
No fim, quem acha que a operação foi um sucesso porque “bateu meta” está lendo o balanço errado. O número que importa é o do capital que segue circulando, da influência que permanece intacta e da economia paralela que sobrevive a cada operação. Ontem, o Estado só apertou os toques. O som parou, mas o sistema continua rodando, e cada vez mais caro.




