Muitos brasileiros apreciam aquela “cervejinha” nos finais de semana, em dias de jogos de futebol ou nos dias festivos. Essa é uma conduta que, em si, não tem relevância jurídica, nem interfere na relação de trabalho. Cada um, em sua vida particular, pode agir com entender nesse ponto.
O problema ocorre quando o trabalhador ou a trabalhadora abusa e se dirige ao posto de trabalho embriagado, inclusive em atividades que tem algum risco adicional de acidente. Já ouvi relatos de várias situações desse tipo ao longo desses anos na advocacia trabalhista empresarial. É realmente impressionante!
Se apresentar bêbado em serviço constitui falta grave, passível de demissão por justa causa do empregado, conforme previsto na CLT. Afinal, uma pessoa nessa condição, além de não estar capaz de exercer suas atividades, pode colocar em risco a si mesmo, aos demais colegas e clientes, bem como praticar atos que manchem a imagem do empregador.
Só que, ainda que seja possível demitir um empregado que habitualmente esteja embriagado em serviço, as empresas devem ter atenção para um aspecto que a Justiça do Trabalho tem considerado em suas decisões: quando o trabalhador ou trabalhadora sofre de alcoolismo, aí já não é possível, em regra, sua demissão. Explico.
Várias decisões judiciais tem compreendido que a pessoa alcoólatra sofre de uma doença crônica, reconhecida pela Organização Mundial da Saúde (CIF- F-10.2) e, por isso, já não responde plenamente pelos seus atos, o que afastaria a possibilidade, em princípio de rescisão contratual. “O empregado alcoólatra não demanda punição, mas tratamento”, é uma expressão comumente usada em diversas sentenças e acórdãos.
Mas o que o empregador deve fazer nessa situação?
Se a empresa tiver conhecimento que algum empregado sofre dessa doença precisa, com todas as cautelas necessárias, encaminhá-lo para consulta que reconheça a incapacidade para o trabalho a fim de que receba do INSS benefício previdenciário correspondente (caso preencha os requisitos legais). Inclusive, em caso de negativa da autarquia federal, é prudente dar as devidas orientações para buscar na Justiça o afastamento.
Também, se confirmada a doença, precisa orientar adequadamente e com total respeito o empregado a procurar tratamento em alguma instituição especializada (igrejas ou ONGs, que tem prestado primoroso serviço social nesse campo).
Essa é uma postura adequada, pois permite que a pessoa doente possa se recuperar e se reintegrar plenamente na sociedade. O alcoolismo é algo sério e tem aumentado bastante nos últimos anos, segundo levantamentos do SUS[1].
Caso o empregado se recuse a tratamento, declarando que não tem a patologia, há entendimento judicial que permite a rescisão do contrato, pois se entende que o empregador tomou todas as diligências possíveis e não pode arcar prejuízos diante da postura do trabalhador.
Em todo o caso, os profissionais de RH e gestores das empresas devem ter o cuidado e atenção redobrados para evitar riscos e também exercer sua função social.
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[1] https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/noticias/2022/fevereiro/atendimento-a-pessoas-com-transtornos-mentais-por-uso-de-alcool-e-drogas-aumenta-11-no-sus