A dor de famílias destruídas pela violência contra a mulher voltou ao centro do debate no Acre com o caso de Juliana Valdivino, jovem de 18 anos morta queimando viva pelo ex-namorado, em Mato Grosso. Mesmo mais de um ano após o crime, a família ainda clama por justiça e transforma o caso em alerta para um cenário que cresce de forma preocupante no estado.
Nos depoimentos colhidos pela reportagem, a mãe de Juliana, Rosicleia Magalhães, denuncia a sensação de impunidade:
“O feminicídio no Acre, o feminicídio no Brasil, tem sido previsto pela sociedade como comum. Porque se fala no momento, tem repercussão, mas a justiça não faz nada. Os jornais divulgam, mas a justiça não tem trabalhado.”
Mesmo tomada pela dor, Rosicleia deixa um recado às mulheres:
“Pelo amor de Deus, mulheres, briguem por nós, tomem atitude. Não dependam do outro para se sentir feliz. Que felicidade é essa que está tirando a tua vida?”
Violência cresce e estado se aproxima de marcas históricas
Os números reforçam o alerta. De janeiro a dezembro deste ano, o Acre já registrou 5 mil ocorrências de violência doméstica, além de 13 feminicídios consumados. Se mais uma mulher morrer pelo mesmo motivo, 2025 empatará com os piores anos da série histórica, 2016 e 2018, cada um com 14 mortes.]

Segundo o Feminicidômetro, o estado soma 90 feminicídios e 158 tentativas em seis anos um retrato de um problema que, para especialistas, está longe de diminuir.
Rede de acolhimento ainda falha
Para a advogada e conselheira do Conselho Estadual da Mulher (CEDIM), Tatiana Martins, o caminho das vítimas em busca de ajuda começa, quase sempre, onde ninguém deveria terminar: o hospital.
“A porta de entrada é o hospital. Ela está machucada e precisa encontrar acolhimento. Se não encontrar, ela não vai para a delegacia. Muitas vezes, ela não se enxerga vítima porque está dentro do ciclo da violência.”
Tatiana critica o abandono das políticas públicas:
“Parece que a gente está enxugando gelo. A violência foi banalizada. Virou ‘mimimi’. As pessoas não enxergam como problema de segurança pública, de direito humano, de dignidade.”
Ela também afirma que o governo federal não enviou recursos para ações de combate à violência contra a mulher neste ano e lamenta que escolas não trabalhem o tema de forma consistente.
A pesquisadora Helen Lirtez destaca que a violência de gênero é construída socialmente ao longo de gerações:
“Faltam processos educacionais de base para meninos. Eles precisam entender, ainda na escola, que não podem matar uma mulher. Parece básico, mas precisa ser dito e os índices mostram isso.”
Para muitas famílias, a dor do luto se soma às falhas do sistema judicial. Júlio Moreira, irmão de Josie (vítima assassinada pelo companheiro) acredita que o país ainda está muito distante de oferecer segurança às mulheres e justiça às famílias.
“A família também é vítima de um crime bárbaro. O Brasil falha. Se o indivíduo não consegue conviver em sociedade, age de forma animalesca, com ânimo de matar, tem que ficar preso para o resto da vida.”
Júlio lembra que o agressor foi “tirando” sua irmã da convivência familiar, um sinal clássico do ciclo da violência, até que fosse tarde demais para intervir.
Por que matam tantas mulheres?
As respostas são múltiplas, desigualdade histórica, machismo, falta de políticas públicas, ausência de educação adequada e impunidade. Mas para quem perde uma filha, uma irmã ou uma amiga, nenhuma explicação justifica o que permanece sendo, ano após ano, uma tragédia anunciada.
Canais de Ajuda
O acolhimento da vítima é essencial para romper o ciclo de violência e desvincular-se do agressor. É fundamental contar com uma rede de apoio, que pode incluir familiares e amigos, além de serviços especializados que oferecem assistência jurídica e psicológica.
As vítimas podem procurar a Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (Deam) pelo telefone (68) 3221-4799 ou a delegacia mais próxima.
Também podem entrar em contato com a Central de Atendimento à Mulher, pelo Disque 180, ou com a Polícia Militar do Acre (PM-AC), pelo 190.
Outras opções incluem o Centro de Atendimento à Vítima (CAV), no telefone (68) 99993-4701, a Secretaria de Estado da Mulher (Semulher), pelo número (68) 99605-0657, e a Casa Rosa Mulher, no (68) 3221-0826.
Com informações de João Cardoso, para a TV Gazeta.



