Emendas são armas limitadas para “pensar o país”
O senador eleito Gladson Cameli nunca dependeu tanto dele mesmo. Nem chega a falar sozinho no deserto da oposição. Por dois motivos: 1º) não tem muito o que dizer; 2º) não há muitos amigos dispostos a ouvir.
Desde a campanha, Cameli já sabia que estaria sozinho. Em vários momentos, a sua equipe de marketing político divergiu da equipe do candidato ao governo pelo PSDB, Marcio Bittar.
Este, com o raciocínio belicoso. Aquele com as duas únicas armas republicanas que possuía: o sorriso automático e a frase decorada: “como senador, vou ajudar todos os 22 municípios do Acre, independentemente da cor partidária”. (observa, leitor cético, que a referência está dita: “armas republicanas”).
No acompanhamento da rotina de campanha, percebia-se claramente (sobretudo no finalzinho do primeiro turno) que era Bittar quem acompanhava Cameli. A mobilização, os acenos e o impulso em participar de uma agenda estavam voltados para o candidato ao Senado. Em boa medida, Bittar deve o segundo turno a Cameli.
Cameli só tem um probleminha básico a enfrentar: a campanha acabou. No plenário do Senado, Cameli vai sentir a fragilidade de sua retórica; vai descobrir que a cortesia e simpatia que lhe são naturais e convincentes não dizem muito em meio a lobos.
Se o Congresso não é lugar para amadores, o Senado muito menos. Há uma vantagem na postura de Gladson Cameli. Uma vantagem que não guarda relação com o fato de ser filho de uma das maiores fortunas do Norte do país. Ao contrário.
Cameli entra no Senado tendo a missão de crescer ali dentro. A vida política dele começa, de fato, agora. A Câmara foi um ensaio, um berço que ensinou pouco. Em fevereiro começa uma nova fase. Por enquanto, ainda no entusiasmo da vitória incontestável, o futuro senador desembainhou as mesmas armas: o sorriso e as emendas (o que restou delas como deputado). Repete-se: ele luta bem com essas armas. Mas, o Senado exige mais.
Nas bases eleitorais, cada vez mais se verá Cameli pousando ao lado de prefeitos, reitores, líderes de associação, acompanhado da manchete com mudança apenas do complemento: “Emendas de Gladson Cameli beneficiam…”
Há um aspecto negativo que acompanha o jovem senador: a ideia entranhada de que ele se elegeu senador mirando o Palácio Rio Branco. Ambição, aliás, reafirmada por Cameli em recente entrevista concedida à TV Gazeta. “Não nego que eu queira ser governador, mas isso não é minha prioridade no momento”. Para eleitor calejado, meia intenção já basta.
Os acrianos (com “i” ou com “e”) torcem para que o mandato seja pleno de êxito. Com uma ressalva: o Senado não serve para quem raciocina como um “vereador federal”. Ali é um espaço para pensar o país. Legislar em função do país. Não apenas defender recursos para melhorar infraestrutura de universidade federal ou comprar motor de popa e barcos para populações isoladas.
No Senado, não se pode raciocinar o mandato com a frase “sobretudo o Acre” sendo defendida na tribuna. O correto é “inclusive, o Acre”.